São Paulo, domingo, 28 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Resíduos invadem chácara em Bauru

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BAURU

Quem caminha pela divisa da chácara de Adilson Bighetti, 42, com o terreno dos fundos do setor metalúrgico da Acumuladores Ajax pode tropeçar em restos de bateria e resíduos da reciclagem do chumbo, que foram deixados na área ao longo dos anos. Os donos dos dois lados da cerca disputam o terreno na Justiça.
Quando se cava um pouco a terra, é possível encontrar ainda mais restos de bateria. "Depois que a fábrica foi interditada, eles cobriram o terreno com capim. Antes dava para ver ainda mais", diz Bighetti, que estava construindo a sua casa na propriedade e teve que mudar os planos.
"Estou procurando uma casa na cidade. Agora estamos morando na casa dos meus sogros. Não sabemos até que ponto vai a contaminação", diz. O seu filho mais velho, de quatro anos, está com 21,5 microgramas de chumbo por decilitro de sangue -o aceitável para crianças, segundo a OMS, é 10. A menina de um ano e meio tem índice de 20,9.
A chácara de três alqueires de Bighetti é uma das quatro propriedades próximas ao setor metalúrgico da Ajax.
Por determinação dos órgãos da saúde, ele teve que abater cerca de 300 galinhas e transferir bois e cabras para outro local. Exames mostraram que o leite, os ovos e a hortelã produzidos ali estavam contaminados.
"Ainda estou contabilizando os prejuízos. Não posso nem pensar em vender a chácara agora, ninguém iria querer comprar. E ainda tenho que aguentar as reclamações dos amigos para quem eu fornecia leite de cabra, achando que era saudável."

Ex-funcionários
Em 1985, houve uma epidemia de saturnismo (quadro de envenenamento agudo produzido por chumbo) entre os funcionários do setor metalúrgico da Ajax.
De acordo com o subdelegado da DRT (Delegacia Regional do Trabalho) de Bauru, Sérgio Branco, praticamente todos os funcionários do setor estavam contaminados. "Naquela época, eles só usavam máscaras de pano, de proteção contra a poeira. São necessários filtros com proteção química", afirmou.
Jorge Pereira, 43, que hoje é caseiro de uma das chácaras vizinhas à fábrica, foi um desses trabalhadores. Ele chegou a ter 70 microgramas de chumbo por decilitro de sangue. Segundo normas do Ministério do Trabalho, o índice aceitável para adultos é de até 40, e, para funcionários expostos à contaminação, até 60.
Depois de ficar afastado por mais de três meses, entrou em acordo e saiu da fábrica. "Eu me sentia muito mal", diz.
No ano passado, houve 30 casos "leves" de saturnismo na Ajax, segundo Branco. Pelas leis trabalhistas, é obrigatória a realização de exames nos funcionários de três em três meses. (AK)


Texto Anterior: Poluição: Descontrole cria "bombas-relógio" em SP
Próximo Texto: Crianças se expõem a risco nas ruas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.