São Paulo, segunda-feira, 28 de maio de 2007

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Cobrança excessiva prejudica alunos

Estudo de economista da USP mostra que criança que sempre recebe ajuda dos pais nos estudos tem desempenho inferior

Segundo pesquisador, auxílio na lição de casa e exigência por notas têm efeito negativo e sugerem que pais podem estar exagerando na dose

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Fazer sempre o dever de casa está fortemente associado a um melhor desempenho, mas o auxílio dos pais nem sempre é benéfico, pois alunos que sempre recebem essa ajuda têm médias menores que os demais. Essa é uma das constatações do economista Naércio Menezes Filho, da USP e do Ibmec-SP, que, a pedido da Folha, identificou características de famílias, alunos e escolas que estão associadas a um melhor desempenho -uma dificuldade que costuma tirar o sono de muitos pais.
Menezes trabalhou com os dados do Saeb (exame do Ministério da Educação que avalia a qualidade do ensino). Outra constatação surpreendente foi que a cobrança de pais por boas notas na rede privada está associada a um desempenho pior dos alunos.
Para chegar a essas conclusões, o economista fez regressões econométricas a partir do Saeb. Trata-se de um exercício estatístico que tenta isolar uma única variável e descobrir seu efeito. É como se, em vez de apenas comparar médias de alunos diferentes, ele primeiro se certificasse de que são estudantes com mesmo perfil socioeconômico e de escolas com características semelhantes.
O pesquisador já havia feito o mesmo em outro estudo realizado em 2006 em que concluiu que a escolaridade da mãe, o maior tempo estudando diariamente na escola, a existência de pelo menos 20 livros na casa do aluno, o salário do professor -na rede privada- ou a formação de turmas heterogêneas -no caso da pública- estavam fortemente associados a melhores notas.

Excesso
Na avaliação de Menezes, os dados que mostram que a ajuda na lição de casa ou a cobrança por notas têm efeito negativo sugerem que os pais, especialmente na escola particular, podem estar exagerando na dose.
"A presença da família é um elemento importantíssimo, mas esses dados podem estar mostrando que os pais, em vez de orientar, estão fazendo a lição de casa pelo filho, quando sabemos que o fato de o aluno fazer o dever aumenta a proficiência. No caso da cobrança por boas notas, isso pode se transformar num desestímulo." Educadores ouvidos pela Folha concordam.
"No caso das particulares, realmente é muito comum os pais ajudarem demais o filho, que acaba não adquirindo autonomia. E achamos péssima a figura do professor particular. O aluno fica viciado nessa ajuda e não presta atenção na aula, pois sabe que depois terá alguém para explicar a lição para ele", afirma Mauro Aguiar, diretor-presidente do colégio Bandeirantes, de São Paulo.
Regina Canedo, diretora do colégio Mopi, do Rio, também sugere evitar professores particulares. Sobre o fato de alunos cujos pais cobram boas notas terem desempenho pior, ela diz que cobrança não pode ser confundida com ameaça."Terrorismo não funciona. É claro que os pais têm que colocar um limite, mas o mais importante é fazer com que os filhos estabeleçam uma rotina de estudo", explica.

Acompanhamento completo
Patrícia Lins e Silva, diretora da Escola Parque, do Rio, dá um exemplo para diferenciar os pais que cobram excessivamente dos que se fazem presentes sem ameaçar.
"Em vez de perguntar somente se o filho fez a lição ou qual nota tirou na prova, pais que valorizam a educação querem saber também o que a criança aprendeu naquele dia, o que ela achou interessante na escola. Essa criança acabará fazendo o dever de casa sem que ninguém precise cobrar", afirma Lins e Silva.
Wagner Sanchez, diretor e coordenador pedagógico do Colégio Módulo, de São Paulo, ressalta a importância de os pais se fazerem presentes.
"É uma forma de os pais dizerem: "Olha, isso é importante para o seu futuro e me preocupa, por isso ficarei atento". Tal acompanhamento deve ser completo, incluindo elogios, broncas, exemplo, disciplina, confiança e decisões em conjunto", diz Sanchez.


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