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LETRAS JURÍDICAS
Conselho de jornalismo como censura indireta
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Depois de duas colunas
dedicadas ao projeto que
cria conselhos de jornalismo nos
níveis nacional (CFJ) e regional
(CRJ), cabe uma terceira e última,
dedicada a pontos específicos do
texto oficial. Desde a primeira, foram numerosas as opiniões emitidas vindas das áreas jurídica e
jornalística. Não vejo razão para
mudar as que publiquei, pois manifestações contrárias são fundamentais para o esclarecimento do
assunto. Este complemento poderá ser útil, no limite das três crônicas programadas.
Começo pela constatação de
que várias competências do Conselho Federal de Jornalismo foram copiadas, quase literalmente,
das que a lei nº 8.906/94 atribui
ao Conselho Federal da OAB. A
cópia, mesmo quando tenha sido
fiel, significa pouco: a OAB não é
autarquia da administração pública indireta, como o serão os
conselhos jornalísticos. A entidade da advocacia merece, além disso, dignidade constitucional própria, única entre as corporações
profissionais.
Quando o projeto parou de copiar o estatuto dos advogados e
alterou o texto, foi para pior. Veja-se o projetado inciso IX, artigo
2º, pelo qual o conselho federal
poderá intervir nos conselhos regionais "em que se constate violação a esta lei ou às suas resoluções, nomeando composição provisória para o prazo que fixar".
No estatuto da OAB, o processo
interventivo depende de "violação grave" (inciso VII do artigo
84). O qualificativo permitirá discutir a gravidade no Judiciário
para impedir a mera intervenção
política, afastando a simples
ofensa alegada pela maioria
dominante.
Outra quebra da repetição do
estatuto da OAB, também para
pior, mostra-se no artigo 15. Remete a "organização, estrutura e
funcionamento do CFJ e dos CRJ,
bem assim as normas complementares do respectivo processo
administrativo", à disciplina dos
regimentos internos. Está por trás
disso a possibilidade de vermos
elementos essenciais da operação
dos conselhos serem resolvidos internamente, sem transparência,
sem os requisitos de garantia previstos para as autarquias da administração pública, conforme o
artigo 37 da Carta Magna.
Na entidade dos advogados, a
preservação da dignidade da lei é
firme. Impede que maiorias ocasionais do conselho federal possam violar direitos de seus inscritos. Além disso, o Conselho Federal da OAB é composto por dois
integrantes das delegações de cada Estado da Federação, que são
compostas por três membros
cada uma. Está assim na lei nº
8.096/94.
A atribuição, na órbita do jornalismo, de questões tão importantes à deliberação dos conselheiros federais trará com ela a
predominância do interesse político deles. Em se tratando de autarquia da administração pública indireta, gerará a possibilidade
de influência dos governos. Influência sempre ruim, seja qual
for o detentor do poder, quando
se refira à comunicação social.
Atrelará o jornalismo dos conselhos jornalísticos aos interesses
governamentais. Basta pensar,
ainda no mesmo sentido, na estruturação dos Conselhos Regionais (na OAB são estaduais) para
determinar o grau de influência
dos grupos nas decisões a serem
adotadas para as impor aos adversários. Concluindo: o jornalismo deve ter assegurada a livre
manifestação de pensamento e de
crítica, sem censura, ainda que
feita sob disfarce de atribuição a
um órgão de classe.
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