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São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 2003

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BENEFÍCIO PARA POUCOS

Menos de um terço das famílias que ganham até três salários mínimos recebe desconto na tarifa

Subsídio ao transporte tem alcance limitado

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os subsídios ao transporte coletivo não atingem atualmente de maneira eficaz a população de baixa renda das principais concentrações urbanas do país.
Na região metropolitana de São Paulo, 67,4% dos que têm renda familiar de até três salários mínimos (R$ 720) não recebem nenhum auxílio para a condução -vale-transporte, dinheiro, isenção ou desconto. Na de Recife, esse índice atinge 76,8%. Nas do Rio e de Belo Horizonte, 62,8% e 70,5%, respectivamente.
Os resultados constam da pesquisa Mobilidade e Pobreza, cuja fase quantitativa foi concluída neste mês pelo Itrans (Instituto de Desenvolvimento e Informação em Transporte) e que será apresentada oficialmente na semana que vem na capital paulista.
Os indicadores, na avaliação do presidente da ONG, Maurício Cadaval, demonstram a ineficácia dos sistemas existentes hoje para subvencionar os deslocamentos das pessoas mais pobres -já que há altos índices de desemprego e de informalidade nesses grupos.
A maioria dessa população tem de tirar dinheiro do próprio bolso para bancar as passagens. O resultado é que, para evitar as altas tarifas, 25,5% das viagens dos moradores de baixa renda da Grande São Paulo são feitas a pé -considerando apenas os deslocamentos superiores a 15 minutos, ou seja, mais de 1,2 km de caminhada.
Praticamente um terço dos moradores com renda familiar de até R$ 720 nessa região metropolitana diz adotar estratégias não-convencionais para economizar com a condução. As principais delas, citadas por 70,6% e 40%, respectivamente, é a compra de passes mais baratos e de vale-transporte de segunda mão -geralmente em bancas clandestinas, que dão descontos nos bilhetes comprados com deságio dos trabalhadores que recebem esse benefício mesmo sem utilizá-lo.
"O vale-transporte está sendo dado, muitas vezes, para quem não precisa dessa forma de condução. E quem realmente precisa está correndo atrás do mercado paralelo", afirma Cadaval.
"Existe a necessidade de pensar em formas de ampliação do benefício, para incluir os mais pobres", defende Marcos Bicalho, diretor-superintendente da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), citando como alternativas os subsídios diretos a desempregados, com a inclusão do vale-transporte nos projetos de seguro-desemprego.
A pesquisa quantitativa do Itrans foi precedida de um estudo qualitativo, cujos resultados foram divulgados em agosto -e que apontavam para a estratégia da população pobre de andar a pé ou de bicicleta para economizar. Em cada uma das quatro regiões metropolitanas foram realizadas entrevistas em 400 domicílios.
A exclusão da população de baixa renda das subvenções do transporte coletivo compromete sua mobilidade, já que ela não costuma ter acesso ao transporte individual de carro e geralmente vive em bairros periféricos, distantes dos centros de emprego.
A mobilidade é medida pela quantidade de deslocamentos em um dia. A pesquisa do Itrans mostra que, entre os que ganham até três salários mínimos por mês, a média não chega muitas vezes a uma viagem diária por habitante -nos dias úteis, é de 0,88 em São Paulo, 0,90 em Belo Horizonte e de 0,86 em Recife. Esse dado exclui apenas os trajetos a pé com duração inferior a 15 minutos.
Dados preliminares de uma pesquisa do Metrô paulista feita em 2002, em contrapartida, apontam que, entre os segmentos mais ricos, com renda familiar superior a 20 salários mínimos, essa média atinge três deslocamentos diários.
A baixa mobilidade dos mais pobres é um indicativo da privação de acesso a serviços de educação, saúde e lazer. Não é à toa que, na Grande São Paulo, mais de 80% das viagens desses moradores (estimados em 4,6 milhões, ou 26,7% da população total) têm como únicos motivos trabalhar, estudar ou procurar emprego.


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