São Paulo, sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

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Permeabilização não evita enchentes, afirma geólogo

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A noção de que o aumento da permeabilização vai ajudar a reduzir enchentes em São Paulo é um mito, segundo o geólogo Arnaldo Kutner, 75, que deu aulas na USP e trabalhou em obras como o rebaixamento da calha do Tietê e o parque criado no mesmo rio. O problema, diz, é o tipo de solo da cidade, bastante impermeável por causa do alto teor de argila. "Aumentar a permeabilização tem uma eficiência muito pequena, porque só uma casquinha será permeável. Vai ser como um mataborrãozinho."

FOLHA - Por que a cidade inunda tão facilmente? É resultado da crescente impermeabilização do solo?
ARNALDO KUTNER - O problema não é só de impermeabilização com concreto e asfalto. Os solos de São Paulo, devido à sua natureza silte-argilosa, têm uma permeabilidade muito baixa, e a água tem dificuldade para atravessá-los. Siltes são materiais mais finos do que a areia, o que dificulta a passagem da água.

FOLHA - Já ouvi de engenheiros que, com as chuvas seguidas, o subsolo de São Paulo está saturado.
KUTNER - Isso é verdade. Com mais de 20 dias seguidos de chuvas, o solo acaba se saturando. Para piorar as coisas, o volume de poros no solo é pequeno e os poros não se comunicam entre si. Todas as colinas de São Paulo -a avenida Paulista, Perdizes, a Pompeia- têm essa composição argilosa, com poros pequenos e isolados.

FOLHA - A prefeitura está construindo calçadas permeáveis e reabrindo córregos que estavam concretados. Isso faz sentido?
KUTNER - Não sou contra essas medidas, mas o nosso solo não é grande coisa na capacidade de absorver água. A eficiência do aumento da permeabilização não é o que se espera.

FOLHA - O sr. está dizendo que esse plano vai fracassar?
KUTNER - Contar com o aumento da permeabilização para resolver o problema das enchentes não faz sentido, porque o solo embaixo é impermeável. Aumentar a permeabilização tem uma eficiência muito pequena, porque só uma casquinha será permeável. Vai ser como um mataborrãozinho numa pia de granito. Logo, essa camada vai ficar saturada de água.

FOLHA - Qual é a solução?
KUTNER - É preciso fazer piscinões, não vejo outra solução. O problema é que as chuvas caem fortes em períodos curtos.

FOLHA - Há algo a ser feito no rio Tietê para elevar a sua capacidade?
KUTNER - A ideia de afundar a calha do Tietê já se esgotou, porque ela atingiu a profundidade dos afluentes. Poderiam criar paredes verticais para reter a água, em vez de paredes em forma de trapézio que existem hoje. Com a parede vertical, o rio teria mais capacidade. Mas o custo dessa construção é absurdo e resolve só até certo ponto. O Tamanduateí tem paredes verticais e já está nos limites do esgotamento. O melhor é cuidar dos afluentes do Tietê, para que a água não chegue tão rapidamente a ele.


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