São Paulo, sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

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Após passar de vítima a suspeita, falsa médica desaparece

Cláudia Maria Gonzaga Ferreira disse ter sofrido seqüestro após ter sido verificado que trabalhava irregularmente em Santa Casa

Delegacia de Taubaté, que apurava o seqüestro, convocou Cláudia Maria para esclarecer a acusação de que não seria médica

RICARDO WESTIN
ENVIADO ESPECIAL A TAUBATÉ (SP)

Depois de passar três dias dando entrevistas à imprensa sobre seu suposto seqüestro, a mulher que afirmou ter sido rendida por dois homens na semana passada e depois, com os pulsos cortados, jogada num rio sem saber nadar, simplesmente desapareceu.
Cláudia Maria Gonzaga Ferreira, 49, não é vista em Taubaté, onde vive, nem em São José dos Campos, onde trabalha, desde terça-feira, quando veio a público a denúncia de que trabalhava como médica sem ter estudado medicina.
A Folha ligou ontem para os telefones dela. Ninguém atendeu. Na casa onde ela vive com o marido, num bairro afastado do centro de Taubaté, estavam apenas os cachorros. Vizinhos contam que o casal recebeu vários jornalistas entre o sábado e a segunda. No sábado, fizeram um churrasco com convidados para comemorar o "renascimento" dela. Na terça, porém, sumiram.
"Ficamos torcendo pela recuperação dela quando soubemos do seqüestro. Mas, quando vimos na televisão que ela se passava por médica, ficamos muito chocados. Como alguém pode brincar com a vida e a saúde das pessoas?", disse uma vizinha.
Cláudia Maria era contratada da Santa Casa de São José dos Campos (cidade a cerca de 30 km de Taubaté) como médica do trabalho havia nove meses. Atendia a funcionários de empresas que têm convênio com o hospital. A Santa Casa diz que ela nunca tratou doentes. Seu trabalho era verificar se os funcionários estavam aptos para o trabalho.
No início do ano, a Santa Casa fez uma conferência dos dados de todos os funcionários. Foi quando descobriu que o registro de Cláudia Maria no Conselho Regional de Medicina pertencia, na realidade, a outra mulher. O Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) vai apurar o fato de ela ter sido contratada sem que seu nome fosse checado com a entidade.
Na quarta-feira da semana passada, o hospital a convocou para esclarecer a dúvida. Ela não foi. Sem conseguir contato com Cláudia Maria, a Santa Casa registrou um boletim de ocorrência na polícia e preparou sua demissão.
No fim de semana, a imprensa da região noticiou o cinematográfico caso da médica rendida por seqüestradores quando saía, à noite, de uma farmácia em Taubaté, e que foi encontrada, na manhã seguinte, dentro do rio Paraíba do Sul, agarrada a um arbusto.
Foi apenas na segunda-feira que funcionários da Santa Casa se deram conta de que a personagem dos noticiários era a mulher suspeita de exercer a medicina ilegalmente.
A delegacia de Taubaté, que investigava apenas o seqüestro, convocou Cláudia Maria para prestar um novo depoimento e esclarecer a acusação de que não seria médica.
"Ontem [anteontem], uma mulher que afirmou ser advogada disse que Cláudia Maria encontra-se neste momento internada, mas que se apresentará na semana que vem", disse o delegado Marcelo Duarte Ribeiro, de Taubaté. "Nunca vimos nada assim. Esse caso é, no mínimo, estranho."
O delegado diz que ela não caiu em contradição em nenhum momento durante os depoimentos. Chegou a fazer o retrato falado dos supostos seqüestradores. No entanto, alguns pontos chamaram a atenção dos investigadores: ninguém da farmácia viu o seqüestro e os criminosos fugiram sem levar o carro dela. Agora existe a suspeita de que ela tenha tentado se suicidar por ter sido "desmascarada".
Segundo a PUC de Campinas, local onde ela disse ter cursado medicina, uma pesquisa com o nome Cláudia Maria Gonzaga Ferreira mostra uma mulher formada em enfermagem. Se comprovada a suspeita de simulação de seqüestro, Cláudia Maria pode ser condenada a até seis meses de prisão.


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