|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Agora, médicos dizem que bebê não era anencéfalo
DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Após quase dois anos de controvérsias, a comunidade científica avalia agora que Marcela
de Jesus não tinha anencefalia,
mas sim merocrania, uma má-formação grave que possibilita
uma sobrevida vegetativa.
A bebê morreu com um ano e
oito meses e se tornou o principal trunfo dos que se opõem à
interrupção da gravidez no caso de fetos anencéfalos. Eles
apontam o caso da menina como contra-argumento às estatísticas de que os anencéfalos
têm sobrevida vegetativa de no
máximo dias.
Em 2007, a Folha ouviu oito
especialistas, e sete deles, após
terem acesso ao laudo e às imagens de ressonância magnética
da menina, atestaram que era
anencefalia, embora alguns
ponderassem que não se tratava da forma clássica da doença.
Para três dos cinco representantes de entidades científicas
ouvidos no STF, Marcela não
tinha anencefalia. Um dos especialistas disse acreditar que a
menina era anencéfala e outro
não se manifestou.
O ginecologista Thomaz Gollop, da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência), explicou que Marcela
tinha, na verdade, merocrania,
que se caracteriza pela presença de um pouco mais da caixa
craniana do que o anencéfalo e
de uma membrana que reveste
o resquício de cérebro e funciona como proteção contra infecções. Gollop foi um dos especialistas que havia dito que
Marcela era anencéfala. Hoje,
justifica que não havia analisado o caso profundamente.
A merocrania, segundo Gollop, é mais rara -ocorre um
caso a cada um milhão de nascimentos, enquanto a anencefalia tem incidência de um em
mil. Os merocrânicos, diz ele,
conseguem ter uma sobrevida
vegetativa maior, embora também muito breve.
Membro da Febrasco (Federação Brasileira de Ginecologia
e Obstetrícia), o médico Jorge
Andalaft Neto endossou ontem
a opinião de Gollop. Em 2007,
ele havia dito à Folha que era
um caso raro de anencefalia,
mas não a clássica.
O professor de neurologia da
USP João Pereira Leite, que
também afirmara que Marcela
era anencéfala, alega agora que
outros médicos puderam ver
com mais detalhes os exames
da bebê para dar um novo parecer sobre o diagnóstico.
Heverton Pettersen, da Sociedade Brasileira de Medicina
Fetal, atesta que Marcela não
tinha anencefalia. "Foi um erro
de diagnóstico", diz. Duas características da menina sustentam a sua tese: ela tinha resquícios de hemisférios cerebrais e
cerebelo (estrutura neurológica responsável pela coordenação dos movimentos).
Já Roberto D'Ávila, do Conselho Federal de Medicina, diz
acreditar que a garota tinha
anencefalia, ainda que tenha tido uma sobrevida atipicamente maior. Ele defende, no entanto, que a discussão do aborto nesses casos não seja feita
com base em exceções.
Texto Anterior: Supremo aprovará aborto de anencéfalo, diz relator Próximo Texto: Marcela: Avaliação de médicos desvenda farsa, afirma ministro Índice
|