|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DEPOIMENTO
A dependência do carro e a dependência do cigarro
CONRADO CORSALETTE
EDITOR-ASSISTENTE DE COTIDIANO
Chegar a São Paulo trazendo na bagagem um prontuário médico que aponta bronquite crônica somado ao vício do cigarro foi como levar
um murro no peito já castigado há tempos pela falta de ar.
Lá no ano de 1996, alguns
testes com o rodízio já indicavam que, sim, era perfeitamente possível deixar o carro
em casa uma vez por semana
em troca de uma leve melhora na qualidade de vida.
Nessa década e meia tive
de me adaptar ao humor climático da grande metrópole.
Inalar cortisona todo o dia,
frequentar hospital vez ou
outra e evitar abrir o segundo
maço foram remediações
inevitáveis. Uma mudança
de hábito inusitada, porém,
me faz muito mais bem.
Dois anos atrás, meu carro
sumiu da rua onde eu o estacionava. Decidi ficar sem.
Tive orgulho de dizer que
não colaborava com o caos
do trânsito. E que a fumaça
dos meus cigarros, praticamente banidos dos locais públicos um ano depois, era nada perto do dano ambiental
de um veículo em circulação.
Apesar de certo conforto
ideológico, eu tenho certeza
de que uma hora dessas vou
ser obrigado a tomar uma decisão radical para continuar
vivo (é o fumo, estúpido!).
A cidade é mais tolerante
que meu corpo e meus ideais.
Vem aguentando os milhões
de carros novos jogados na
rua a cada ano. Vem aguentando a falta de mobilidade e
o excesso de gás carbônico.
Só me pergunto daqui,
deste sufoco particular: até
quando um umidificador no
quarto e um vidro preto fechado sobre quatro rodas
que transportam quase sempre uma só pessoa serão suficientes para remediar essa
loucura asmática coletiva?
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Motorista enfrenta mudanças na semana Índice
|