São Paulo, sábado, 29 de outubro de 2005

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INFÂNCIA PERDIDA

Polícia investiga a participação de 26 pessoas em esquema; meninas eram abordadas perto de escola em Igarapava

SP apura rede de exploração sexual infantil

RICARDO GALLO
ENVIADO ESPECIAL A IGARAPAVA

ROGÉRIO PAGNAN
DA FOLHA RIBEIRÃO

Uma pessoa foi presa, cinco estão foragidas e outras 20 também podem ser presas acusadas de participar em esquema de exploração sexual de crianças e adolescentes em Igarapava (a 448 km de São Paulo). Até ontem, a Promotoria identificou 12 meninas entre 10 anos a 16 anos como aliciadas.
Na lista dos suspeitos estão policiais civis e militares, comerciantes, políticos e "pessoas extremamente influentes na sociedade", de acordo com o Ministério Público Estadual de Igarapava.
O promotor Antonio Carlos Guimarães Junior, 32, e o delegado Cloves Rodrigues da Costa, 44, disseram que as meninas eram aliciadas em um bar próximo à escola Alfredo Cesário de Oliveira, para fazer programas em motéis e ranchos.
O esquema funcionava "24 horas por dia", segundo Guimarães Junior, e cada programa custava entre R$ 10 e R$ 30. "A gente sempre soube que isso existia na cidade, mas não tinha noção da proporção, do tamanho que é", afirmou o promotor.
A investigação começou no último dia 18 quando a diretora de uma escola flagrou um auxiliar de escritório de 27 anos deixando, às 11h30, duas alunas na porta da escola: uma de 13 anos e outra de 15.
As duas garotas foram levadas para a Promotoria, onde confirmaram terem feito um programa com o rapaz. O auxiliar foi preso sob a acusação de estupro, atentado violento ao pudor e favorecimento à prostituição -pela lei, sexo com meninas de até 14 anos é considerado estupro, mesmo que seja consentido.
A partir daí, as investigações do Ministério Público conseguiram identificar as outras meninas e, por elas, outros homens que participaram do esquema. Entre eles estão cinco policiais militares que foram recolhidos ao quartel, em Franca. Dois policiais civis também estão nessa lista -um deles já teve a prisão decretada e está foragido.
As outras quatro pessoas que estão foragidas são comerciantes. Segundo a Promotoria, até um comerciante -que não estava na lista de investigação- fechou as portas do seu comércio nesta semana e desapareceu.
Guimarães Junior afirmou que desde o início das investigações uma parte da população tem criticado seu trabalho, alegando que as garotas "eram sem-vergonhas e que não havia motivo para acusar as pessoas de bem" envolvidas. "A tolerância para essa prática está num grau extremamente elevada na cidade. Isso nos deixa triste", disse. "A maioria dessas meninas não tem estrutura física. Não tem nem seios. Para eles, parece ser um prêmio."
"Nunca imaginei que isso fosse acontecer", afirmou Joana, 29, mãe de Júlia (nomes fictícios), 13, uma das meninas. Segundo Joana, a filha tinha tinha comportamento rebelde, era "levada", mas não a ponto de ser seduzida.

Susto
"Nós nos assustamos demais porque as meninas falaram nomes de pessoas conhecidas na cidade", disse a advogada Rubiana Maria Custódio dos Santos, presidente do conselho tutelar. "Foi uma bomba na cidade." De acordo com ela, as meninas não têm maturidade suficiente para ter consciência do que fizeram.
O delegado Costa vai ouvir novamente as nove adolescentes e, ainda, os empresários, políticos e comerciantes mencionados nas denúncias. Ele deve requisitar exame nas meninas para saber se já tiveram relação sexual. A intenção é saber se alguma delas mentiu. O delegado estima que o inquérito levará três meses para ser concluído.
A demora, explica o delegado, é para evitar condenações precipitadas. Se condenados, os acusados podem pegar de seis a dez anos por estupro e atentado violento ao pudor, mais outros quatro anos por favorecimento à prostituição.

Outro lado
A Secretaria da Segurança Pública informou, por meio de uma nota, que as denúncias estão sendo investigadas. Se for comprovada a participação dos policiais, eles podem ser expulsos.
O rapaz preso alegou, de acordo com a polícia, que não conhece as meninas.
O advogado José Ramirez Neto, que defende um dos acusados que está foragido, afirmou que pediu um habeas corpus no Tribunal de Justiça e que o cliente dele "nem conhece as meninas".


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