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Presas do PA dizem ser comum "cela mista" e casos de gravidez
DA ENVIADA ESPECIAL A BELÉM
Mulheres e homens presos
na mesma cela em delegacias
no interior do Pará são uma
prática comum e não são raros
os casos de gravidez. Essa realidade está suspensa, por ora,
após o pente-fino do governo
estadual, que trouxe, até ontem, 23 novas detentas do interior ao único presídio feminino
do Estado, na região metropolitana de Belém.
Em visita ao Centro de Reeducação Feminina em Ananindeua, a Folha ouviu relatos de
violência física e sexual semelhantes ao caso da menor L., 15,
detida em uma cela com cerca
de 20 homens em Abaetetuba.
A presidiária Valdecira Pantoja, 28, já engravidou duas vezes desde que foi presa em
2003 -seu caçula nasceu há 15
dias e foi entregue a uma irmã,
sem período de amamentação.
A primeira gravidez, há dois
anos, aconteceu em Cametá,
onde disse ter ficado na delegacia e em dois pavilhões diferentes do presídio masculino.
"Ficava lá convivendo...
ameaça e desprezo. Tinha que
tentar ficar com um menino lá
para tentar ver se não me faziam mais mal", disse à Folha.
"Não sei quem é o pai. Eu fiquei
lá com os meninos, nem eu sei
quem é o pai", completou Valdecira. Ela diz que tem quatro
sentenças por roubo e furto e
uma condenação de oito anos.
Ela chorou ao saber que teria
direito de amamentar o bebê,
mas uma agente carcerária interrompeu a conversa, dizendo
que isso não foi possível porque não há berçário no local.
Uma das detentas recém-chegadas disse ter testemunhado um caso de abuso de poder e estupro na delegacia. "Há
um mês, os policiais trouxeram
uma mulher, que é doente
mental, a Nazaré. Os presos a
puxaram para dentro da cela e
se serviram dela. O investigador ficava de cima filmando
com o celular. Foram uns sete
ou oito homens que abusaram
dela, que estava doida mesmo",
disse Iara de Jesus Batista
Abreu, 35, que estava na delegacia de São Miguel do Guama.
A visita ao presídio feminino
foi possível devido à diligência
da CPI do Sistema Carcerário
ao local, ontem pela manhã.
"Pelo que estamos percebendo,
esse caso da menina L. não é
novidade no Pará", afirmou o
presidente da comissão, deputado Neucimar Fraga (PR-ES).
A reportagem conversou
com dezenas de mulheres no
local e conheceu as celas. Todas afirmaram que não é incomum a detenção mista de homens e mulheres, e a maioria
que relatou ter ficado nessa situação afirmou que não aconteceu abuso. A maioria das vezes por serem pessoas "conhecidas" dos presos ou policiais.
"Se a mulher não for conhecida, aí já sabe o que acontece,
né?", disse Ana Lúcia Silva, 45.
Outras detidas também explicaram que visitas íntimas podem ser arranjadas nas delegacias -um eufemismo para outro problema: policiais que supostamente recebem pagamento de presos para trazer
prostitutas para o local.
Edinalva Borges da Silva, 30,
ficou cinco meses em uma cela
com 12 homens, no município
de Primavera, segundo seu relato. Engravidou e teve um filho de outro preso, mas considera que seu relacionamento
foi consensual. "Ele me protegeu e ficou comigo, teve facilidade do delegado", disse.
Questionada pela CPI, a delegada-corregedora responsável pelo interior do Estado, Elcione Moura, disse que o caso
de L. foi a única denúncia recebida e que tudo o que chega é
apurado. "Essa é a primeira vez
que algo assim chega ao nosso
conhecimento", disse. A Folha
questionou a governadora Ana
Júlia Carepa sobre o mesmo
assunto; ela não respondeu.
(LS)
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