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Após reencontrar namorado da adolescência, ex-freira dá à luz gêmeos depois dos 50
DA ENVIADA ESPECIAL A
COROMANDEL (MG)
Após 12 anos no convento,
Maria Helena reencontrou o
amor da sua vida, Noé Justino
Cruvinel. Já tinha passado de
50 quando decidiu ser mãe.
Grávida de trigêmeos, passou
os últimos três meses de gestação em repouso no convento onde havia sido freira.
Hoje, aos 55 anos, ensina as
primeiras letras do alfabeto a
Gabriel e Rafael, 4. O terceiro
bebê, Daniel, morreu no útero. O pai, Noé, 64, com cabelos e barba grisalhos e longos
em razão de uma promessa a
Nossa Senhora da Abadia,
instrui os meninos como ordenhar as vacas da fazenda
onde moram, em Coromandel, no Triângulo Mineiro.
"Sempre quis ser pai. Pensava: "Pra quê trabalhar dia e
noite se não tenho para quem
deixar o que construí?'", conta Noé, caçula de 12 irmãos,
que por 20 anos cuidou sozinho da mãe doente.
Vítima da menopausa aos
40 anos, a ex-freira engravidou com a doação de óvulos e
tratamento gratuito. "Eu
olhava para as galinhas com
os pintinhos, a vaca e o bezerrinho, e pensava: "Todo ser vivo tem filho. Por que eu sou
diferente? Por que vou passar
por essa vida sem filhos?'"
Na fazenda onde moram,
parece que o tempo parou. A
casa, com paredes de estuque
e teto sem forração, foi construída há cem anos. Os alimentos, todos plantados no
local, são preparados no fogão
a lenha. A única TV da casa
quebrou na semana passada.
Na última quarta, a família
montou um varal com flores
campestres e fitas azuis na
porteira para receber a Folha. A seguir, o depoimento
de Maria Helena sobre a
aventura de ser mãe após os
50 anos.
(CLÁUDIA COLLUCCI)
"Namorei o Noé quando tinha 19 anos e dava aulas em
uma escola rural. Era aquele
namoro à moda antiga. Ele vinha, conversava com meu pai
sobre a roça, o tempo e ia embora. Nem pegar na mão podia. A mãe dele não queria
que ele se casasse. Eu vi que a
história não tinha futuro e fui
cuidar da vida, estudar.
Fiz enfermagem, trabalhei
na Santa Casa e, aos 26, entrei
para a Congregação das Irmãs
Franciscanas da Imaculada
Conceição. Passei por Araraquara, Goiânia, Araxá e Ribeirão Preto. Fiz pedagogia, psicologia. Ao final de 12 anos,
senti que minha vida estava
inútil. Aquela redoma do convento não tinha nada a ver comigo. As freiras me achavam
rebelde demais. Eu me sentia
como se estivesse vegetando.
Aos 38 anos abandonei o
convento. Um ano depois
reencontrei o Noé. A mãe dele tinha morrido e ele estava
triste, abatido, na mais completa solidão. Foi aí que ele
pediu para que a gente voltasse a namorar. Eu disse: "Só se
for sério, se for para casar".
Casamos em um ano.
Aos 40, minha menstruação, do jeito que veio, foi. Eu
olhava para as galinhas com
os pintinhos, a vaca e o bezerrinho, e pensava: "Todo ser vivo tem filho. Por que eu sou
diferente? Por que vou passar
por essa vida sem filhos?'
O Noé também queria ter
filhos, mas estava muito envolvido com questões de inventário da família. Os amigos diziam para ele: "Noé, você trabalhou a vida toda e vai
deixar as terras para quem?".
Chegaram a sugerir que ele
procurasse uma prostituta
para ter um filho, tipo barriga
de aluguel, sabe? Eu dizia:
"Noé, deixe disso. Depois vai
ficar essa mulher entre nós.
Não tem o menor cabimento".
Eu também não iria ficar de
escanteio. Foi quando descobri que havia a chance de engravidar com óvulos doados.
Tinha ido a Ribeirão Preto
[SP] fazer um transplante de
córnea e fui até a clínica do dr.
Franco Júnior, contei minha
história e me aceitaram no
programa de filantropia. A cada vez que tinha retorno era
uma luta. Saía cedinho de casa na garupa do cavalo do
Noé. São 7 km de terra até a
estrada para pegar o ônibus
até Uberlândia [MG]. De lá,
pegava o ônibus para Ribeirão Preto, mais de sete horas.
Os dois primeiros tratamentos não deram certo. No terceiro, os três embriões "vingaram". Foi uma festa. O Noé me
tratava feito cristal. Ouvia
opiniões de todos os jeitos, a
maioria de que era louca de
engravidar nessa idade.
Mas, como não podia ficar
fazendo a viagem porque a
gravidez era de alto risco, fui
para o convento em Ribeirão.
Ficava num quartinho em repouso absoluto. Saía só para
ir ao refeitório e à capela. No
final, comecei a sentir contrações e descobrimos que um
bebê havia morrido. Fiz um
parto de emergência. Até as
faxineiras do hospital haviam
rezado por mim e pelos bebês. Foi aí que percebi que a
coisa tinha sido brava. O Gabriel nasceu com 1,750 kg e o
Rafael com 1,450 kg.
Com dez dias, voltamos à
fazenda. O Noé cuidava da casa e da fazenda. Fazia três mamadeiras por noite, ajudava
no banho. Fiquei por conta
dos meninos. Amamentei até
os três meses e meio. Agora,
quero dedicar a vida que me
resta a eles. Não me importo
quando dizem que eu e o Noé
parecemos avós deles. Se
Deus nos deu a possibilidade
de concebê-los, ele nos dará o
tanto de vida que for preciso
para vê-los criados."
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