São Paulo, segunda-feira, 30 de julho de 2007

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MOACYR SCLIAR

Esperando o rei Arthur


O que quer, a voz? O que quer, a mulher que o chama? Será que está precisando do guerreiro da Excalibur? Será?

 Nova biografia conta como Diana decidiu se casar com Charles e revela detalhes do seu relacionamento com o futuro rei dos britânicos. "The Diana Chronicles" é o mais completo relato da trágica vida da princesa Diana, cuja morte num acidente de carro, em Paris, completa dez anos em 31 de agosto. Logo nas primeiras páginas, a autora Tina Brown escancara um dos segredos mais íntimos do herdeiro do trono da Inglaterra. Quando está em estado pré-ejaculatório, Charles gosta que sua parceira o chame de Arthur, primeiro sussurrando no seu ouvido, depois mais alto, mais alto, mais alto... Mundo, 29 de julho.

NÃO SE SABE ao certo se alguma vez existiu um rei britânico chamado Arthur, ou se se trata de uma figura lendária, dessas que a imaginação popular freqüentemente cria para satisfazer a humana necessidade da crença em heróis poderosos. Mas, para os que acreditam em sua existência (e estes, entre parênteses, não são poucos) Arthur foi um valente monarca, que reinou na Inglaterra por volta do quinto ou do sexto século, e que enfrentou com galhardia os invasores anglo-saxões em várias batalhas. Numa delas, segundo a tradição, matou, sozinho, 960 inimigos. Arthur tinha uma espada famosa, a Excalibur. Diz a lenda que esta espada permaneceu por muito tempo cravada numa rocha, da qual ninguém poderia arrancá-la. O jovem Arthur resolveu tentar e, para surpresa de todos, extraiu a Excalibur com a maior facilidade.
A partir daí foi sagrado rei, e, sempre empunhando a Excalibur, enfrentou com bravura os inimigos do seu reino tornando-se um modelo de líder guerreiro. Desde então a Excalibur excita imaginações. Não são poucos aqueles que se vêem empunhando a espada e mergulhando-a sem piedade no corpo de seus inimigos. A Excalibur é um símbolo. Como o é o rei Arthur.
Mas o que, afinal, aconteceu com ele? De novo: não se sabe. Mesmo que tenha existido, certamente está morto, dizem os céticos. A isto reagem os admiradores do rei. Para eles, Arthur não morreu. Continua vivo, em algum mítico lugar. Ali está ele, sentado em seu trono, empunhando a Excalibur. E o que faz? Nada, uai. Reis, em princípio, não têm obrigação de fazer nada, e mesmo que tivessem tal obrigação, dela Arthur agora estaria livre. Doze batalhas! Novecentos e sessenta inimigos trucidados em apenas uma delas! Cumpri o meu dever, pode Arthur sussurrar para a sua querida Excalibur. Que, como toda a espada, mesmo mágica, não contestará. No lugar onde estão reina o silêncio. O silêncio da eternidade.
Mas este silêncio às vezes é rompido. Às vezes o rei Arthur ouve, ou pensa ouvir, uma voz a chamá-lo.
Uma voz feminina, uma voz ardente, a voz de uma mulher que está no auge da paixão e quer que seu parceiro também chegue ao auge da paixão. É uma voz que vem de longe, de um lugar e de um tempo agora inacessíveis para Arthur. Isto inquieta o monarca. Ele, que nunca teve medo de nada, que sempre enfrentou os maiores desafios, perturba-se. O que quer, a voz? O que quer, a mulher que o chama? Será que está precisando do guerreiro da Excalibur? Será?
Para esta pergunta o rei não tem resposta. E isto o inquieta. Não poderiam, esses dois, fazer amor em silêncio?, pergunta, angustiado, à sua fiel Excalibur. Que, no entanto, não lhe responde. Mesmo as espadas mágicas não têm resposta para tudo.


MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha


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