São Paulo, domingo, 30 de agosto de 2009

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Dança comigo

Baile vespertino disfarçado de chá beneficente atrai senhoras que dançam com profissionais contratados previamente

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Só na semana passada, Tita Podboy foi a quatro bailes. Tita, 93, adora dançar. Viúva há 20 anos, ela costuma contratar um personal dancer para acompanhá-la. Paga R$ 120.
"Meu marido era um pé de valsa maravilhoso, saíamos muito", diz Tita, quatro filhos, dez netos, doze bisnetos.
Mesmo que estivesse vivo, o marido de Tita não poderia ir com ela na semana passada ao Chá Dançante, um baile que ela gosta especialmente. Marcado para toda última terça-feira de cada mês, o chá reúne cerca de 70 mulheres e tem uma peculiaridade: é só para senhoras. Os pares delas são contratados antecipadamente.
Inaugurado há oito anos pelo empresário-dançarino Ricardo Liendo, 40, o baile é vespertino, sempre das 14h30 às 17h30. "Eles ligam para confirmar nossa presença e perguntam (a quem atende o telefone) se a gente vai ao chá "beneficente". O marido confirma: "Sim, ela vai", sem saber que a mulher passará a tarde dançando com um personal", gargalha uma "Hebe Camargo" de vestido vermelho, sandália dourada e xale de crochê branco.
Como ela, muitas das habituês não querem se identificar. "Não coloca meu nome aí, pelo amor de Deus. Meu marido não tem ideia", diz outra loira, idade declarada 61, vestido curto preto, meia arrastão "trabalhada" com desenhos.
Ela conta que, para todos os efeitos, naquele momento está no geriatra. "Vai ter churrasco à noite em casa, mas controlo à distância", diz ela, girando feliz nos braços de Ricardo Lima, 23.
Os dançarinos são adorados pelas damas. Cada uma aponta um favorito. "Conversa com o Emerson", sugere a aposentada Josette Martine. "O mais cotado é o Ewerson", aposta a professora Sônia Magnoli.
Por sua vez, eles dizem que não basta dançar bem, é preciso ouvir bem. "Elas gostam de falar", diz Ewerson.

Chá em cores
O DJ Eduardo La Luna abre o chá com "New York, New York". Entre uma música e outra, as senhoras se divertem à procura de um par, e eles fazem todo o gestual cavalheiresco que tanto as encanta. Maquiadas e vestidas como se estivessem em uma festa à noite, elas se entregam inteiramente à fantasia do baile de gala.
Cada mulher se senta em uma cadeira cujo espaldar está encapuzado com um pano de cor: vermelho, verde ou dourado, de acordo com o preço do ingresso. Uma cor no espaldar custa R$ 110; duas, R$ 165,00; e a dourada, R$ 220.
Se a cadeira é só vermelha, ou verde, então a frequentadora vai ser chamada para apenas uma das três músicas de cada sequência.
As sequências podem ser de samba de gafieira, bolero, salsa, swing, forró, chá chá chá, pagode, valsa e country.
Se são duas cores cobrindo o espaldar, a dama tem o direito a duas danças em três. Se a cadeira é dourada, bem, aí ela pode dançar o tempo todo.
Regina Whitaker, 77, uma das poucas a revelar nome e idade, vai além: "Não gosto de homem careca, barrigudo, nem de dentadura."
Depois ser tirada para dançar por Reimi Airuchi, 31, Regina conta que namorou "muito" e sempre gostou de "rapazes mais jovens". Já que é assim, pergunta-se: teve algo com um personal?
"Imagina. O rapaz que namorar com alguma das frequentadoras não entra mais no evento", dizem três senhoras que ocupam a mesma mesa.
Não é bem assim.
Airuchi, por exemplo, é namorado há um ano da "cadeira dourada" Dioscênia Carvalho.
"Meu falecido marido era 18 anos mais velho; o Reimi, 25 anos mais novo", diz ela, dois filhos de 37 e 33 anos. De vestido frente-única cheio de babados que farfalham nos rodopios, ela diz que ainda vai a outro baile.
Próximo das 17, a frequentadora de meia arrastão descrita no sexto parágrafo diz que, ao sair, vai colocar um casacão para cobrir o traje da tarde -e não "dar bandeira" em casa. Na mesma mesa, uma amiga dela afasta a reportagem: "Se meus filhos sabem que eu estou aqui a uma hora dessa vão pensar que eu sou a belle de jour!"


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