São Paulo, sexta-feira, 30 de setembro de 2011

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Sem vaga, HC manda para casa mulher com 26 quilos

Hospital das Clínicas tem dez vagas para internação de pessoas com anorexia

Paciente recusada tem o peso médio de uma criança de nove anos e já esteve internada no local outras três vezes

LAURA CAPRIGLIONE

DE SÃO PAULO

Na noite de quarta-feira, Maria Cleneilda Fernandes de Oliveira, 27, passava mal na fila de espera do Hospital Municipal de Santo André.
Sofrendo há 11 anos de anorexia nervosa e bulimia, Cleneilda chegou ao extremo: seu corpo, 1,55 metro de altura, pesa apenas 26,4 quilos -menos do que a massa de uma criança de nove anos.
A fraqueza era tanta que ela quase não escutava. Tinha tortura. O corpo todo doía. Sem energia, não conseguia manter a temperatura corporal -tremia de frio. Os pés enegrecidos indicavam problemas circulatórios.
A família da moça, moradora de Mauá (Grande São Paulo), na véspera, havia tentado interná-la no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, onde ela se trata desde novembro de 2007. Não conseguiu. As dez vagas do serviço especializado em transtornos alimentares já estavam cheias.
"A psiquiatra disse que ela podia ter uma parada cardíaca súbita. Orientou-nos a entrar no primeiro pronto-socorro em caso de piora", afirmou a prima Maria Cleide Fernandes Sousa, 47. "Saímos de lá desesperados."
Cleneilda tem IMC (índice de massa corporal) igual a 11. O IMC é a relação entre o peso e o quadrado da estatura de um indivíduo. Para alcançar o IMC normal (entre 18,5 e 24,99), a jovem teria de pesar, no mínimo, 44,4 quilos.

MAIS UMA CHANCE
Na sala de espera do hospital de Santo André, Cleneilda chorava segurando os cabelos quebradiços. "Eu queria mais uma chance no Hospital das Clínicas", disse.
Ela já ficou internada no HC. Na primeira vez, ficou três meses. Na segunda, quatro. Na última, sete meses.
Sempre que saiu, voltou a perder peso. O irmão Raimundo Cleilton Fernandes, 34, diz que ela já perdeu cinco quilos em uma semana.
"Os médicos do Hospital das Clínicas já disseram que não aceitam mais a minha irmã lá. Mas ela não faz isso porque quer. Ela é doente. Será que sou eu quem deve explicar isso aos médicos?", pergunta Cleilton.
Há três semanas, diante da piora de Cleneilda, o HC encaminhou-a para internação na psiquiatria do Hospital Nossa Senhora de Fátima.
"Eram 56 pacientes para duas auxiliares. Dementes, alguns comiam as próprias fezes, gritavam, tentavam me bater", lembra Cleneilda.
A família tirou-a do local e voltou a tentar o HC.
A anorexia apareceu na vida de Cleneilda aos 16 anos -época em que faz a maioria de suas vítimas. A doença tem atingido uma parcela crescente de adolescentes (meninas na maior parte), entre 12 e 22 anos, com índice de mortalidade que chega a atingir 20% dos doentes.
Os leitos especializados ainda são tão escassos que, na própria assessoria de comunicação da Secretaria de Estado da Saúde, não se sabia informar quantos leitos existem para tratar anoréxicos e bulímicos em estado grave como o de Cleneilda.
Até ontem ela continuava no hospital de Santo André.


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