|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Fim de festa
Pressão de moradores força casas noturnas a saírem dos Jardins
Ana Otoni - 9.set.2003/Folha Imagem
|
|
Em 2003, faixa da associação de moradores pedia o fechamento das boates na área
VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Dez anos depois de se consolidar como um dos bairros de
vida noturna mais agitada da
cidade, os Jardins conseguiram
expurgar as boates que se firmaram na região. Só no trecho
da rua da Consolação entre as
alamedas Itu e Lorena, que já
abrigou mais de 30 baladas nos
últimos anos e onde havia um
vaivém festeiro, não há uma
boate sequer. Nenhuma. Zero.
A lista dos ambientes fechados abrange lugares tão ecléticos quanto simbólicos, como o
pub O'Malley's e as boates Ultralounge -ícone do movimento gay- e Blue Pepper, que avaliava o "pedigree" dos jovens e
cobrava R$ 300 de entrada dos
clientes VIP do VIP do VIP e foi
uma das últimas a ser fechada,
no segundo semestre de 2009.
A resistência ao uso misto do
bairro, dizem os donos das casas noturnas fechadas, é materializada na Samorcc, a associação dos moradores. Na vizinhança, as queixas eram de barulho, algazarra e congestionamento nas madrugadas.
Moradores vizinhos às casas
noturnas fizeram um sem-fim
de abaixo-assinados contra as
boates e registraram queixas na
delegacia do bairro; algumas
delas, por prostituição infantil,
viraram inquérito policial.
"A vizinhança começou a reclamar e tivemos de intervir.
Mandamos às autoridades
competentes. Os moradores de
uma região onde havia uma
concentração enorme de pessoas agora comemoram o resgate do sossego", diz Célia Marcondes, diretora da associação.
De 2006 para cá, a Subprefeitura de Pinheiros informa ter
fechado oito lugares por falta
de licença de funcionamento,
muitos dos quais polarizavam
outras casas em órbita. Com o
fim das boates chaves, uma a
uma foi fechando as portas.
"A lei de zoneamento diz que
os Jardins podem ter um uso
misto. O que não pode é a boate
trazer incomodidade aos vizinhos", diz Orlando de Almeida,
secretário de Controle Urbano.
Dono do antigo Ultralounge,
Bob Yang conta que a maior dificuldade para manter a boate
foi a intervenção dos moradores e que não quer abrir outra
casa noturna nos Jardins.
"Foi comprar dor de cabeça.
Eles exercem um poder de denúncia que é bastante forte e
têm muita influência para conseguir uma fiscalização pesada.
Os órgãos vieram todos de uma
só vez", afirma Yang.
Depois de ter a primeira boate no lado direito da Consolação fechada por irregularidades
com o zoneamento, ele abriu
outra no lado esquerdo da mesma quadra, também fechada.
"A associação dos moradores
não queria mais casas noturnas
nos Jardins. Fizeram uma varredura nas boates para o bairro
se tornar só residencial. Mesmo quem tinha alvará acabou
sendo fechado", diz Ronaldo
Rinaldi, dono do antigo Atari.
Para a urbanista Regina Meyer, coordenadora do Laboratório de Urbanismo da Metrópole da USP, a prefeitura tem
de criar regras rígidas para o
uso misto, que faz parte da dinâmica das cidades.
"São Paulo não foi preparada
para o uso misto. As pessoas
passam o tempo todo batalhando contra isso, mas é o futuro
da cidade", afirma Meyer.
Coordenador do Núcleo de
Antropologia Urbana da USP,
José Guilherme Magnani diz
que o uso dos bairros é resultado de negociação, mais do que
planejamento da prefeitura.
"Se os moradores têm mais
força política, conseguem impor seu ponto de vista. E foi o
que ocorreu nos Jardins. Os lugares foram para outras regiões
onde a correlação de forças é
diferente, mas o que faz a riqueza da cidade é o uso misto", diz.
Migração
Dos Jardins, a vida noturna
migrou para o lado das ruas Bela Cintra e Augusta voltado para o centro e para os galpões industriais da Lapa e da Barra
Funda, na zona oeste.
Vizinha de muro da antiga
Blue Pepper, a síndica Iara
Coelho diz que os moradores já
se mobilizaram para fechar a
nova boate ainda sem nome
que abriu no lugar e que três
baladas irregulares já foram expulsas do entorno desde 2006.
"É um barulho de bate-estaca
contínuo. Não conseguimos
dormir, nossa vida está um inferno. Estamos fazendo quatro
abaixo-assinados para os órgãos públicos e para a Promotoria", afirma Coelho.
"O cachorro se muda e leva as
pulgas. Se fazia barulho aqui,
vai incomodar os vizinhos do
mesmo jeito para onde quer
que vá", diz o empresário Fernando Pereira, antigo frequentador da noite dos Jardins. "O
que muda é o poder de influência dos vizinhos", afirma Yang.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Frases Índice
|