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Procurador é maior autor de sambas-enredo no Rio
Baeta Neves, o Didi, morto em 1987 aos 52 anos, levou 24 músicas à avenida
Autor de clássicos como
"É Hoje" e "O Amanhã" chegou a brigar com a mãe, que discordava de seu envolvimento com o samba
FÁBIO GRELLET
DA SUCURSAL DO RIO
Figura constante nos tribunais do Rio de Janeiro nos anos
1970, o procurador da República Gustavo Adolfo de Carvalho
Baeta Neves morreu em 1987 e
não deixou obras como jurista.
Mais de duas décadas após sua
morte, porém, não há Carnaval
em que as músicas que ele compôs não ecoem pelas ruas e salões de todo o país.
Autor de clássicos como "O
Amanhã" ("A cigana leu o meu
destino, eu sonhei") e "É Hoje"
("A minha alegria atravessou o
mar e ancorou na passarela"),
Baeta Neves -ou Didi, como ficou conhecido- é o maior vencedor de disputas de sambas de
enredo da história do Carnaval
carioca, dizem pesquisadores.
Em 52 anos de vida, levou 24
sambas ao desfile -16 na União
da Ilha, 4 no Salgueiro e 4 no
bloco Boi da Freguesia, que deu
origem à escola Boi da Ilha.
O que hoje soa como motivo
de orgulho era, nos anos 1950,
uma vergonha para sua família.
"Ele brigou com a mãe e nunca
mais falou com ela", conta Alberto Mussa, sobrinho do compositor e autor, em parceria
com Luiz Antonio Simas, do livro "Samba de Enredo - História e Arte", recém-lançado pela
editora Civilização Brasileira.
A família do sambista havia
sido muito rica, mas perdeu a
fortuna quando o pai dele morreu, com apenas 35 anos, em
1937. Nessa época, Baeta Neves
tinha apenas dois anos e sua família se mudou do Méier, onde
chegou a ter motorista particular, para a ilha do Governador,
onde ocupou um porão.
Aos 19 anos, em 1955, o compositor venceu sua primeira
disputa de samba-enredo, na
União da Ilha. Para amenizar
broncas em casa, assinou usando o apelido Didi. Enfrentando
o preconceito da família, ele
continuou concorrendo e quase sempre vencendo. Em 1967 e
1968 concorreu também no
Salgueiro e venceu, mas não assinou a autoria, ainda hoje atribuída apenas a Aurinho da Ilha.
Em 1971, casado com uma
mulher que também criticava
seu envolvimento com o samba, segundo Mussa, Didi se
afastou do Carnaval. A decisão
não durou mais que sete anos.
Antes da folia de 1978, já com
outra mulher e após abandonar
o cargo de procurador, ele voltou à ala de compositores da
União da Ilha. Mas as regras da
ala exigiam um ano de "carência", em que ele não poderia
disputar o samba. Por isso, diz
Mussa, "O Amanhã" foi assinada apenas por João Sérgio.
Em 83 concorreu na Ilha e no
Salgueiro, ambas do Grupo Especial. Embora não figurasse
como autor no Salgueiro, a notícia se espalhou e o samba de
Didi foi descartado pela Ilha.
Mas ele venceu no Salgueiro.
Nos dois anos seguintes, voltou
a vencer a disputa na Ilha.
Em 1987, Didi voltou a vencer no Salgueiro. Vítima de um
derrame e portador de cirrose,
não pode ir à escola na noite da
escolha do samba. Morreu em
abril, sem deixar filhos.
Quatro anos depois, o compositor virou enredo da União
da Ilha. O samba que o homenageou diz: "Hoje eu vou tomar
um porre, não me socorre, que
eu tô feliz". "É um retrato fiel
da rotina e do espírito dele",
afirma o sobrinho.
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