São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 2008

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Mulher branca e rica é maior vítima de crime

Estudo da UFMG aponta que essas são as características de quem tem mais chances de ser vítima de violência no país

Pesquisa mostra ainda que portar armas e freqüentar eventos sociais diariamente aumentam os riscos de ser roubado ou furtado

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Os hábitos de Lygia Horta, moradora há 54 anos de Moema (zona sul de São Paulo), mudaram bastante por causa do medo da violência. Ela hoje evita andar a pé pela vizinhança, usa o carro até mesmo para se deslocar para um restaurante no bairro e decidiu fazer de sua casa uma fortaleza, segundo sua própria definição, para evitar furtos ou roubos.
Alguns podem até ver exagero em tanta precaução, mas um estudo realizado pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, da UFMG, mostra que algumas características de Lygia aumentam as chances de ser vítima de crimes como roubos, furtos, arrombamento a residência e roubos a carros. Ela é mulher, mora numa área nobre, tem nível superior, é branca e vive numa casa.
O estudo, que trabalhou com dados de uma pesquisa de vitimização feita pelo Ilanud (órgão da ONU sobre delitos e tratamento do delinqüente) e pela USP em 2002, mostrou que, além dessas características, outras duas também estão correlacionadas a uma maior chance de ser vítima desses crimes: portar arma e freqüentar eventos sociais diariamente.
Para calcular o risco de ser vítima de um desses crimes, Betânia Peixoto, Mônica Andrade e Sueli Moro procuraram identificar, a partir das respostas dos entrevistados, fatores que, isoladamente, aumentavam essa probabilidade.
Essa técnica é necessária porque a simples comparação de percentuais poderia levar a resultados inconsistentes. Se, por exemplo, na população branca houver mais pessoas com maior nível de renda e vivendo em áreas de alto padrão, é de se esperar que haja mais vítimas de roubos e furtos não por causa da cor da pele, mas, sim, por causa dessas outras características.
Ao controlar todas os elementos possíveis, as pesquisadoras tentaram comparar grupos de perfil semelhante. Trabalharam com a pesquisa de vitimização de 2002 porque foi a última a aplicar o mesmo questionário em quatro capitais (Rio, São Paulo, Recife e Vitória). A vantagem desse tipo de pesquisa é que é o entrevistado quem diz se foi vítima de crime. Em estatísticas de secretarias da Segurança, há, para alguns crimes, alta subnotificação.
O fator que mais contribuiu para aumentar a chance de ser vítima de roubo, furto, arrombamento a residências e roubo a carros é portar arma (119% a mais de chance de ser vítima).
Betânia Peixoto alerta, no entanto, que não se pode estabelecer uma relação de causalidade, já que não se sabe se a pessoa armada é mais vítima por se expor mais ao perigo ou se, por já ter sido vítima, decidiu comprar uma arma para se proteger de eventuais riscos.
Freqüentar eventos sociais diariamente foi a segunda característica mais determinante -aumentou em 75% a chance. Depois, vieram morar em área de alto padrão (42%), ser mulher (31%) e ser branco (28%).

Jovens
Como a pesquisa de vitimização não investiga homicídios, esse padrão é bastante distinto do comumente encontrado entre as vítimas de assassinatos, que acontecem principalmente em áreas pobres e entre jovens e negros.
"No caso de ser jovem, por exemplo, nossa pesquisa não encontrou uma relação significativa. Isso sugere que eles são mais vítimas dos crimes que analisamos não por serem alvos preferencias pelo fato de serem jovens, mas, sim, por se exporem mais a situações de risco. Jovens com comportamentos mais parecidos com o de adultos, por exemplo, têm chances muito próximas de serem vítimas", diz Peixoto.
Como a pesquisa de 2002 foi feita em quatro cidades, foi possível comparar também a probabilidade de um indivíduo com as mesmas características ser vítima de um dos crimes analisados em cada capital.
Nessa análise, as chances de ser vítima em Recife e São Paulo se mostraram maiores do que no Rio ou em Vitória. "Ao contrário do evidenciado pela mídia, o Rio não é a capital mais perigosa do Brasil", dizem as autoras no estudo.

Queda
A Folha procurou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, que respondeu que não comentaria pesquisas feitas por outros institutos. No entanto, ponderou que houve queda em alguns crimes desde 2002. O site da secretaria mostra que de 2002 a 2007, para a cidade de São Paulo, houve queda de 20% na taxa de roubos ou furtos de carro e de 12% na taxa de roubos por 100 mil habitantes. Os furtos, no entanto, apresentaram aumento de 15% no mesmo período.


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