São Paulo, quarta-feira, 31 de março de 2010

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GILBERTO DIMENSTEIN

Amor digital


Juntos, desenvolveram uma máquina capaz de detectar as cores. Mas terão de se separar para tocar o projeto nos EUA


O CASAL de namorados Nathalia Patrício e Fernando Gil tem vários prazeres em comum: dançar, lutar boxe, andar de bicicleta e estudar engenharia da computação -ambos são alunos da Escola Politécnica, da USP. Agora, terão de se separar por algum tempo por causa de outro prazer a dois: inventar engenhocas.
Eles criaram um meio de os cegos não precisarem mais de ajuda para saber o valor de uma nota de dinheiro e para distinguir as cores. "Acabamos descobrindo que tínhamos inventado um programa realmente inédito", conta Nathalia.

 

Batizado de Aurie (uma saudação indígena), o pequeno aparelho fez que eles fossem selecionados entre candidatos de vários países para participar de uma incubadora de projetos nos Estados Unidos. Lá, receberão apoio para desenvolver sua invenção e colocá-la no mercado. "Tudo começou sem a menor pretensão." Era apenas um trabalho escolar da faculdade que acabou numa sensação de solidão.
Pesquisadora do LSI (Laboratório de Sistemas Integráveis), ligado à Poli, Nathalia participa de um grupo da graduação que pesquisa os meios de um computador conseguir detectar cores e transmiti-las em voz alta -esse tipo de aparelho já existe.

 

Acabou o semestre e, enfim, o trabalho foi entregue. Nathalia, contudo, queria ir mais longe: sua ideia era criar um aparelho menor, de fácil uso. "Mas, àquela altura, eu já estava sozinha." Até que o namorado, mais velho, aluno do mestrado, resolveu entrar no projeto dela como parceiro. Juntos, desenvolveram uma máquina, de menor tamanho, capaz de detectar as cores. Isso significa que um cego poderá se vestir com menos dificuldade.
A originalidade acabou surgindo por causa de uma peculiaridade do Brasil: o dinheiro brasileiro, diferentemente do norte-americano, apresenta-se em notas de várias cores. Seria possível, portanto, implantar uma calculadora, de modo que o computador associasse os valores às cores. Com isso, o projeto foi selecionado nos Estados Unidos.

 

O problema é que apenas uma pessoa poderia viajar para lá. Nathalia está no meio de um curso e, para completar, apesar de engenheira, morre de medo de avião. "Estou melhorando", desconversa. O jeito era Fernando ir sozinho.
O fato é que o casal vai se separar por vários meses. Ela não parece preocupada, talvez por imaginar que dificilmente o namorado vá encontrar alguém com quem tenha tantos pontos em comum -do boxe à computação, passando pelo prazer de se dedicar às invenções comunitárias. Aliás, ambos são alunos do curso de engenharia comunitária.

 

Para descrever a si próprios, Nathalia lança mão de uma imagem da informática: "Somos perfeitamente compatíveis, seguindo o mesmo protocolo".

 

PS- As fotos da máquina (e, é claro, do "casal protocolo") estão no Catraca Livre (catracalivre.com.br).

gdimen@uol.com.br


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