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Oscar Vilhena Vieira

Quando a bola acaba

O 7 a 1 nos obriga a buscar transformações. Um ponto essencial é associar o futebol à educação

É fascinante a cumplicidade que surge entre os brasileiros quando o tema é futebol. Não há hierarquia, classe ou raça. Após a hecatombe da ultima terça-feira (8), faxineiros, financistas, garçons, juristas, crianças e velhos partilham, em pé de igualdade, análises, lamentos, xingamentos e, sobretudo, fabulosas piadas.

É impossível deixar de reconhecer a importância do futebol na constituição de nossa identidade. Afinal, em que outra circunstância da vida brasileira nos igualamos e comungamos de um mesmo destino?

Este precioso patrimônio intangível vem sendo incansável e insaciavelmente corroído há décadas por gatos cada vez mais gordos. Se mais uma simples derrota nos levaria a cobrar mudanças incrementais, a falência múltipla face à Alemanha nos obriga a buscar transformações mais profundas e disruptivas. A oportunidade de uma "destruição criadora", de que nos fala o economista austríaco Joseph Schumpeter, nos foi aberta pelo dilacerante 7 a 1.

Há muito que fazer. Um ponto essencial, no entanto, seria associar radicalmente o futebol à educação. De forma semelhante ao que fizeram os alemães depois do fiasco de 2000, ou como ocorre nos esportes profissionais norte-americanos, só chega ao profissionalismo quem passa pela escola.

Hoje no Brasil são milhares de jovens que, de fato, abandonam a escola para se submeter a intermináveis e perversas peneiras. A exigência da Lei Pelé para que os clubes cuidem da educação de seus jovens atletas vem sendo cumprida apenas por uma pequena elite de nossos times. Como diversas investigações do Ministério Público vêm expondo, o garimpo por craques tem gerado uma nova forma de exploração e mercantilização de mão de obra infantil.

Há notícias de familiares que chegam a pagar 25 mil reais para que seus filhos participem de testes nos chamados clubes de formação. Lamentam-se casos de olheiros e "professores" que rapinam pais e mães desesperados por formar um Neymar ou um Thiago Silva.

Apenas uma parte ínfima desse exército terá uma oportunidade. Muitos deles cairão rapidamente nas garras de agentes, que os comercializarão como gado. Estima-se que, somente no ano passado, mil e quinhentos jogadores brasileiros, em sua maioria muito jovens, foram vendidos ao exterior.

Para a imensa maioria dos que se profissionalizam no Brasil está reservado um futuro pouco promissor. Calcula-se que 85% de nossos jogadores profissionais ganhem menos de dois salários mínimos por mês e, em face da estupidez do calendário, ficam desempregados quase metade do ano, como denuncia o Bom Senso Futebol Clube.

O futebol é hoje uma indústria global e implacável, além de tentacular e, nos termos da revista "The Economist", corrupta. De joia da coroa que um dia encheu os olhos do mundo, o Brasil vem se tornando um mero fornecedor de talentos para exportação, em detrimento de nossos campeonatos e, sobretudo, de um futuro para os nossos garotos. O fato é que a imensa maioria ficará sem bola, sem escola e sem perspectiva. Apenas uma conjugação radical desses dois universos poderia transformar o futebol num efetivo instrumento de inclusão para milhares de boleiros das periferias sociais brasileiras e, por que não, melhorar o seu desempenho.


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