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Entrevista - Fernando Haddad, 51

SP cobra revolução, desde que não se mexa em nada

NA VÉSPERA DE SANCIONAR O PLANO DIRETOR, PREFEITO DIZ QUE SEGUIRÁ SUA INTUIÇÃO E MINIMIZA POPULARIDADE BAIXA

MARIO CESAR CARVALHO DE SÃO PAULO

"Cobra-se muito a revolução desde que não se mexa em nada". Foi com uma variação da frase-chave do romance "O Leopardo", de Tomasi di Lampedusa (1896-1957), que o prefeito Fernando Haddad (PT) respondeu à Folha se acha a população de São Paulo conservadora. No livro de Lampedusa, nobres aderem ao novo poder para continuar mandando.

Hoje (31/7) Haddad sanciona o Plano Diretor, com um espírito diferente dos nobres de Lampedusa. O plano pretende mudar a cidade ao aumentar a densidade populacional ao longo das avenidas e destinar um volume inédito de recursos para habitação social. Revolução sem mudança, aliás, não existe, segundo ele.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

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Folha - O Plano Diretor de 2004 já tinha a principal diretriz do novo plano, o aumento da densidade populacional ao longo de avenidas que concentram o transporte público, mas ela não saiu do papel. Por que seria diferente agora?
Fernando Haddad - Houve um aprendizado. São Paulo tem uma característica política bastante incomum. Tivemos um pêndulo ideológico --Jânio, Erundina, Maluf, Pitta, Marta, Serra, Kassab e Haddad-- que acarretou em descontinuidade. No urbanismo não foi diferente.

O plano corrige isso?
Radicalizamos algumas propostas que a prefeita Marta [Suplicy] não conseguiu implantar. Uma delas é o coeficiente básico igual a um.

O que é isso?
Significa que você dá ao proprietário o direito de construir uma vez a área do lote. Tudo que for acima disso ele é obrigado a pagar uma outorga. Isso vai compor um fundo, o Fundurb, que promove políticas de transporte, de moradia, política ambiental. Criamos também uma morfologia nova para a cidade: miolo de bairro terá baixa densidade, eixos de mobilidade terão alta densidade.

As condições da cidade mudaram nos últimos dez anos.
Seria impensável dez anos atrás você implantar 150 km de faixas exclusivas de ônibus em 12 meses. Nós fizemos. Seria impossível fazer um plano cicloviário de 450 km até 2015. Hoje existe mais compreensão de que transporte de massa e ciclista têm prioridade sobre o carro. Houve uma evolução conceitual, que veio de fora do Brasil. As grandes cidades do mundo fizeram isso nos anos 80. São Paulo perdeu tempo e nós estamos recuperando o tempo perdido.

A administração do sr. é reprovada por 47% dos paulistanos, segundo o Datafolha, um dos piores índices, similar ao do Celso Pitta e Kassab. Isso não seria um sinal de desaprovação aos planos do sr.?
Quando eu saí do governo [federal], o Datafolha fez uma pesquisa e a área mais bem avaliada foi educação. Isso foi depois de oito anos de trabalho, não de oito meses. Os projetos têm prazo de maturação. Se eu for me guiar pelos humores da conjuntura --Copa, 7 a 1--, eu não miro a grandeza que São Paulo tem.

A reprovação não o afeta?
Existe uma volubilidade muito grande dos humores desde junho do ano passado, que até tento entender. Mas o prefeito de São Paulo não pode se deixar guiar pelos humores conjunturais, e São Paulo é marcada pelos humores conjunturais.

O que mudou?
A sociedade está num momento de buscas. A minha campanha ajudou a instalar esse clima em certa medida, quando eu disse que de casa para dentro a vida tinha melhorado muito, que precisava melhorar a vida da porta pra fora. Existe uma demanda imediata pela melhora das condições nas metrópoles. Mas não dá para dar uma resposta para isso em um ano.

O ex-presidente Lula diz que já xingou o sr. quando estava preso num congestionamento e frisou que ficou impressionado porque ninguém no ônibus o defendeu.
Eu vivi esse mesmo sentimento no MEC. Cobravam uma revolução, desde que eu não mexesse em nada. Lembra quando eu anunciei que iria acabar com o vestibular? O país quase virou do avesso. Hoje a USP discute a adesão ao Enem, cinco anos depois.

Qual será o impacto concreto do Plano Diretor na cidade?
Terá mais habitação no centro, menos espigões no miolo dos bairros, direcionamento dos investimentos para os eixos de mobilidade e espalhamento do desenvolvimento. Em cinco anos você já começa a ver alteração.

O sr. já sabe se vai ampliar o horário do rodízio ou a área que ele atinge?
Os técnicos da CET tem uma preferência pela ampliação do perímetro. Vou tomar uma decisão técnica. Tem outra característica: São Paulo é pouco simpática a experimentalismo. Isso é cada vez mais comum nas metrópoles --testar hipóteses na prática.

A cidade é conservadora?
Cobra-se muito a revolução desde que não se mexa em nada. Isso é impossível. Como eu estou disposto a mudar a cidade, vou seguir a minha intuição de que existe uma chance de que a cidade descubra um destino para o qual ela está vocacionada. Essa cidade pode mais.

O plano duplicou a área de habitação social. A prefeitura, porém, deve R$ 67 bilhões. De onde virá verba para a área?
O quadro institucional mudou. Hoje temos Minha Casa, Minha Vida, de subsídio federal, o Casa Paulista, estadual. Faltava o município. O plano amplia a área de Zeis (zona de interesse social) e destina 30% de toda a outorga onerosa para subsídio a moradia.

Quanto dá isso?
O Fundurb deve chegar a R$ 500 milhões em 2015. Trinta por cento disso são R$ 150 milhões, só de subsídio municipal. Hoje se aplica R$ 20 milhões em moradia.

A Cohab, que responde por essa área, foi entregue a Paulo Maluf. A Folha mostrou que funcionários faziam campanha em vez de trabalhar.
Eu não gosto de "fulanizar" da maneira como a imprensa "fulaniza". Fiz um acordo antes das eleições com o PP. Eu preciso do Ministério das Cidades para que a habitação saia do papel.

O ex-presidente Lula tem feito críticas contundentes à política de comunicação da prefeitura. Ele diz que o sr. não tem conseguido mostrar o que faz para a população. Lula está certo?
Nós temos que melhorar muito. Temos de encontrar canais para mostrar melhor o que fazemos. Tem muita coisa boa acontecendo, e as pessoas não sabem quem fez.
A última licitação de hospital na cidade foi no governo Marta [2001-2004]. Eu comprei um hospital privado, o Santa Marina, e este mês vou lançar o edital do hospital de Parelheiros, cuja terra já foi adquirida. Definimos com o Metrô onde será o hospital de Brasilândia, para compatibilizar com a linha 6.
Quantas pessoas sabem que depois de dez anos teremos três novos hospitais em São Paulo, um dos quais será entregue até o final do ano? Não tenho dúvidas que precisamos comunicar melhor.

O PT atribui ao sr. o pífio desempenho do ex-ministro Alexandre Padilha, candidato do PT ao governo paulista. A prefeitura tem culpa?
Quando eu estava com quatro [pontos nas pesquisas], não acusei ninguém e ganhei a eleição. Quando o Padilha apresentar suas propostas, ele será muito bem sucedido.
O Padilha é um quadro muito promissor no partido, mas ministro não é conhecido. Fui ministro por oito anos e comecei com dois pontos. Ninguém sabe quem é o ministro. Tem muito trabalho pela frente.


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