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Universidades em crise

Gritos e cadeiraço

Para impedir aulas, estudantes que apoiam a greve empilham carteiras e fazem 'piquetes sonoros', gerando clima de tensão em parte da USP

THAIS BILENKY DE SÃO PAULO

Salvo por um ou dois cartazes, a greve na USP passa despercebida em boa parte das unidades. Por outro lado, em alguns departamentos a paralisação impôs um clima de tensão e suspendeu a rotina acadêmica.

Para impedir professores de darem aula, estudantes de ciências sociais recorrem ao chamado "cadeiraço", ação que consiste em empilhar carteiras em frente às salas e nos corredores.

Também promovem "piquetes sonoros" --gritam palavras de ordem, apontam "fura-greves" e esmurram portas e mesas.

Há alguns dias, uma professora foi obrigada a interromper a aula devido a um "piquete sonoro". "Meu dever é proteger os alunos", disse aos estudantes, temendo um enfrentamento entre aqueles que assistiam ao curso e os grevistas.

Nos corredores da Faculdade de Educação e dos departamentos de Ciência Política e Filosofia, "cadeiraços" restam intocados por dias. "Ninguém nem tenta tirar, porque vai gerar um atrito com os estudantes", diz Othon Novaes, 22, um dos líderes da greve.

"Parece singelo, né? São só algumas cadeiras. Mas há um poder por trás", comenta um professor que não quis ser identificado devido ao clima "hostil" por lá.

Esse poder é aquele conferido em assembleia. Aprovada a greve estudantil, o argumento do "interesse coletivo" é evocado toda vez que alguém a "fura".

O professor de política Rogério Arantes esboçou uma teoria sobre o "cadeiraço". Num documento endereçado a seus alunos, notou um padrão constante nos movimentos grevistas de 2013 e 2014.

As primeiras assembleias, que decidiram pela greve, tiveram adesão expressiva. As seguintes, que aprovariam o "cadeiraço", geraram dissidência e esvaziamento --é o momento em que os "cadeiraços" se impõem como demonstração de força, teorizou Arantes.

Alunos menos mobilizados começam a se sentir afetados. Então voltam às assembleias na tentativa de retomar as aulas.

Em manifesto público assinado por docentes do Departamento de Ciência Política da USP, "o cadeiraço é um instrumento de privatização do espaço público por parte daqueles que querem impor seus interesses e visão sobre a universidade".

Professores da filosofia também elaboraram carta aberta e promoveram um debate sobre o "cadeiraço".

"Cada sala de aula vazia por imposição de força aparece como a negação da universidade e, mais especialmente, de uma faculdade que, orgulhando-se de sua condição de célula-mater da universidade, tem a responsabilidade de pensá-la."

Aluno da filosofia, Vitor Fiori, 28, considera o "cadeiraço" necessário para evitar o prejuízo de alunos que dependem do bandejão e da biblioteca para manter as atividades da graduação. "Como esses serviços também estão paralisados, não temos condição de continuar frequentando aulas."

Othon Novaes disse que "os que fizeram uma opção individualista não podem causar ônus àqueles que fizeram uma opção pelo coletivo". "Se alguém fura o movimento, o grevista se ferra e ele se dá bem."

Para ele, as greves estudantis surtiram efeitos positivos, como o aumento do número de vagas na graduação e a contratação de professores no departamento de letras, em 2003, e reposição de professores aposentados na gestão de João Grandino Rodas (2010-2013).

"Não faz o menor sentido. Greve surte efeito quando trabalhadores suspendem a atividade como condição para chamar os proprietários dos meios de produção para negociar", diz José Álvaro Moisés, docente da ciência política e um dos signatários do manifesto de seu departamento.

Alvo de "piquete sonoro" no início da greve, Moisés terminou o curso com atividades on-line. "É absurdo. Esse grupo minoritário de alunos está mandando na faculdade. É grave porque interrompem atividades de ensino e de pesquisa."


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