Na periferia, mãe gasta 20% do salário em escola privada
Pais dizem escolher ensino particular para proteger filhos da violência
Alunos têm aulas de canto gospel e religião; instituições proíbem palavrões e obrigam a usar uniforme
Ao mesmo tempo em que aumenta a migração de escolas privadas para estaduais, na periferia de São Paulo colégios particulares são vistos como uma espécie de "amuleto" por algumas famílias que moram em áreas de risco.
Na região do Capão Redondo (zona sul de São Paulo), uma das mais violentas da cidade, escolas públicas e privadas separam dois grupos, às vezes, até na mesma rua: o de famílias vistas como "organizadas" e o de outras com menos condições.
Pais com renda mensal inferior a R$ 1.000 optam por desembolsar um quinto do salário numa escola particular para afastar o filho da violência, tráfico de drogas e indisciplina que temem encontrar nas escolas públicas.
Em troca, encontram instituições, em geral, religiosas, nas quais se proíbe palavrões e se exige o uso de uniformes.
Nesses locais, "todos os alunos têm pai e mãe, roupa lavada, comida na mesa e TV a cabo", definiu um professor que não quis ser identificado. "Mais difícil é trabalhar com aluno cujo pai está preso, a mãe trabalha fora e quem cuida é o vizinho."
A escola adventista Casi fica numa travessa da estrada de Itapecerica, na zona sul, a metros de distância de uma favela. Os alunos têm aula de ética e educação religiosa, canto gospel e inglês.
Mesmo sendo católica, a manicure Sílvia Pereira prefere manter a filha no Casi a colocá-la numa pública. "Acho que não cuidam direito", diz. Para isso, ela desembolsa todo mês R$ 220 de seu salário de R$ 1.000.
"Faço esse sacrifício, porque tenho medo da violência. Meu vizinho diz que, na escola pública, ninguém respeita ninguém", conta.
A vendedora Tatiana dos Santos paga R$ 400 para a filha estudar no colégio católico São Vicente de Paulo, no Capão Redondo. A escola pública mais próxima à sua casa "tem muita briga, entra e sai quem quer, o ensino é péssimo e todo mundo ouve funk", observa. "Você fica com medo da companhia, as crianças ficam ao deus-dará."
Na particular, por outro lado, a filha "nunca teve problemas com brigas. Os pais são presentes. As famílias são mais estruturadas", avalia.
FLUXO
A rede privada está em expansão, a despeito do aumento de alunos que deixam colégios particulares para estudar em públicos.
Desde 2011, as matrículas em colégios particulares em São Paulo aumentaram 13,7%, segundo a Secretaria Estadual da Educação.
A pasta não informou quantos alunos deixaram a rede do Estado para se matricular em escolas privadas. No período, a rede estadual de São Paulo perdeu 200 mil matrículas.