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Walter Ceneviva

Futuro do fim da história

O processo transformador não parou, nem nada sugere que parará, até quando extinto o próprio sol

Mais de uma vez lembrei aqui a visão de Francis Fukuyama ao situar o fim da história no século passado. Em recente entrevista à Folha, o pensador americano explicou sua posição e as variáveis que reconhece na somatória da democracia e do capitalismo.

Olhando no espelho retrovisor da história atual, sabe-se que leis gerais de cada nação ou julgamentos uniformes do Judiciário na Europa ou em países de criação europeia somente nortearam o direito em cada país livre a partir de 1800. Não antes, pois apenas no século 20 foram criadas as centenas de nações independentes de hoje. Antes disso, passaram-se séculos e séculos, até a chegada aos 20 mil anos, nos quais terá surgido o "Homo sapiens", a caminho do que somos hoje.

Estamos, portanto, nós, Fukuyama e pensadores atuais ou dos últimos 100 a 150 anos, incluídos no mesmo primeiro tempo do jogo da vida na Terra.

Na compreensão desse quadro é que se tem o espaço aberto pela etapa contemporânea, ou quase. Mas ainda lemos muito de Aristóteles, em escritos de uns 350 anos antes de Cristo, quando gentes e costumes, ideias e ideais, mesmo na falada democracia ateniense, tinham pouco a ver com o conjunto das realidades heterogêneas de hoje.

Formulações radicalmente diferenciadas compuseram a nova estrutura de vida coletiva, muito embora o pensamento de Aristóteles e pensadores de todos os séculos sobreviva no conturbado passar dos anos.

O processo transformador não parou, nem nada sugere que parará, até quando extinto o próprio sol, que hoje nos aquece. Esse momento final, de transformação, será tão distante no futuro que nenhum interesse existe em o definir ou situar. Basta acreditar que o ciclo evolutivo, do qual conhecemos tão pouco, transcorrerá sem interrupção, em etapas marcadas por momentos ou anos nos quais se dirá novamente que a história terminou. Lavoisier disse bem que na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.

Nesse quadro, o limite evolutivo do direito praticado hoje vem marcado pela pluralidade dos valores muito diversos, presentes na Babel do mundo mutante de agora, na variedade dos países nórdicos aos do centro da África, da realidade da América do Norte para a do Azerbaijão.

É o primeiro momento em que todos temos formas de informação do que se passa em todas as latitudes. O direito de todos, com o conhecimento ampliado da existência planetária, vive a passagem do elitismo tradicional, nas profissões jurídicas, para a abertura ao acesso de todas as camadas do povo, tanto no serviço público quanto na atividade privada.

A quantificação tem, como subproduto inevitável, o rebaixamento ético das classes envolvidas, gerado pela dureza da competição por melhores posições em todos os grupos profissionais.

No Brasil as imigrações europeias e asiáticas interferiram nesse progresso, ampliando o espectro das questões éticas. Pode até aumentar com o maior influxo da contribuição chinesa. É ponto oposto ao da realidade na Atenas de Aristóteles, quando só uns poucos tinham acesso nas decisões da Ágora. Compuseram a síntese da evolução intelectual do mundo grego. Com eles houve um fim da história. Com o Renascimento italiano outro. E, assim, iremos até o último fim.

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Danuza Leão

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