Bairros rejeitam áreas de moradia popular
Nova lei prevê mais que dobrar zonas reservadas para habitação de menor renda em SP, mas enfrenta resistência
Secretário diz que há 'conflito latente' em mistura de classes e admite alguns erros em demarcação de áreas
"Para nós, uma ou duas ZEIS (zonas para habitação popular) não fazem nem cócegas", brinca Evaniza Rodrigues, 45, militante da União dos Movimentos de Moradia. "Queremos moradia, mas não queremos guetos. A cidade é o espaço da mistura", diz.
Para muitos, nem sempre essa mistura é bem-vinda.
As ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) são áreas destinadas à moradia popular dividas em três faixas: HIS 1, para famílias com renda de até três salários mínimos (R$ 2.364), HIS 2, para até seis salários mínimos (R$ 4.728) e HMP, para até dez (R$ 7.880).
Esse tipo de zona concentra boa parte das polêmicas que orbitam a proposta de revisão da lei de zoneamento.
Ela prevê um aumento de mais de 100% nesses territórios em relação à lei vigente. No total, as áreas demarcadas como ZEIS correspondem a mais de cinco vezes a área da Subprefeitura de Pinheiros.
Mas a controvérsia é menos sobre a área total destinada às ZEIS e mais sobre os locais onde elas foram demarcadas --como partes de Vila Leopoldina (oeste) e Tatuapé (leste).
"Muita gente está se posicionando contra a gravação dessas zonas em seus bairros. É um conflito latente", diz Fernando de Mello Franco, secretário de Desenvolvimento Urbano. "Há bairros que se incomodaram com a proposta de coexistência de várias camadas da população."
O advogado Fábio Araújo Pereira, 39, afirma que não se trata de uma luta de classes.
"Construímos nossa casa em Itaquera a muito custo e, agora, a área foi marcada como ZEIS 1 [de favelas e loteamentos irregulares]. Cadê a ZEIS em Higienópolis e nos Jardins?", questiona Pereira, que teme ter sua casa desapropriada por uma "mixaria".
Segundo Daniel Montandon, diretor de uso e ocupação do solo da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, não há desapropriação vinculada à demarcação de ZEIS --as construtoras podem ou não comprar os terrenos, conforme a lógica de mercado.
Pedro Luis Soares, 37, presidente da Associação Amigos da Vila Aricanduva (zona leste), teve a área de sua casa demarcada como ZEIS 3 (destinada a imóveis ociosos, encortiçados ou deteriorados).
"Não entendemos nada. Esta área é totalmente habitada", questiona. "Pior: construtores estão assediando moradores oferecendo metade dos valores praticados antes da demarcação."
O secretário de Desenvolvimento Urbano admite que alguns "equívocos na demarcação desta ou daquela zona podem existir". "Alguns foram detectados. Isso é natural. Estamos no meio do processo, corrigindo essas falhas, que são raras."
Para o presidente do Secovi, Claudio Bernardes, "um terreno marcado como ZEIS é automaticamente desvalorizado", mas os empreendimentos na maioria delas são pouco viáveis.
(FERNANDA MENA)