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Cidade dos EUA foca saúde para vencer droga

Baltimore era conhecida como 'capital da heroína' e hoje trata dependentes

Método usado inclui ações coordenadas com diferentes agências do governo, universidades e o setor privado do país

LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A BALTIMORE

Cidade que já foi chamada de "capital da heroína" nos EUA, Baltimore tem uma receita para conter o problema: encará-lo como questão de saúde pública a ser tratada de forma coordenada por diferentes agências do governo, o setor privado e a universidade. E, claro, recursos.

Na cracolândia, em SP, uma tentativa de solução começou no dia 3, em operação com policiamento ostensivo e assistência social e de saúde numa segunda fase.

Baltimore, a 50 minutos de Washington, é conhecida há 30 anos pelo alto número de dependentes químicos -10% da população, ou 62 mil pessoas, segundo o Departamento de Saúde.

Para lidar com estatísticas que só pioravam, a prefeitura tirou o problema das mãos da polícia e passou para o Departamento de Saúde.

Em 1996, criou o bSAS -sistemas de abuso de substâncias em Baltimore-, uma autarquia que congrega esforços em diferentes frentes e tem também a colaboração de ONGs como a do investidor George Soros.

Despejou dinheiro: US$ 60 milhões (R$ 106 milhões), no Orçamento de 2011, que a crise econômica no país deve cortar em 20% neste ano.

E passou a usar táticas para persuadir -e não obrigar- usuários a se tratarem.

A Folha visitou albergues, clínicas e a sede do bSAS para ver como a cidade onde as mortes por overdose superavam os homicídios em 1999 derrubou tal índice em 30%, de 327 para 229, de 2000 a 2009 (o dado mais recente).

"Se o Brasil quer lidar com o problema, a primeira coisa é colocar dinheiro", disse à Folha Clark Hudak, um psicólogo clínico que ajudou a criar e hoje administra a Recovery Network.

Para convencer a opinião pública, a prefeitura apresenta uma conta segundo a qual cada dólar gasto economiza US$ 12 em tratamento de emergência, polícia e Justiça.

Linda Trotter, que gerencia um albergue para dependentes sem casa e os encaminha ao tratamento, conta que, para atrair tanta gente (as 350 camas estão sempre ocupadas), evita sermões. "Não checamos histórico criminal. Só revistamos, para que não entrem armas nem drogas."

O albergue é uma espécie de rede de emergência dos dependentes de heroína.

Para dar o passo seguinte, a reabilitação, Linda convocou 13 agências do governo que operam no prédio serviços que vão desde a análise clínica até orientação e agências de empregos.

"Se pusermos os serviços do outro lado da cidade, entre esta porta e a próxima, perdemos o paciente."

Em outra ponta da cidade, em um dos bairros mais pobres, Lilian Donnard dirige a Glenwood Life, uma clínica que, afirma, recebe quem já está no fundo do poço.

Na recepção lotada, um aviso proíbe fumar no banheiro. "Nem cigarro, nem maconha, nem crack."

SUCESSO

A estimativa convencional aponta que 1 em cada 3 dependentes de heroína se recupera, e os demais reincidem. Há sucesso para quem está no fundo do poço?

"Alguns conseguirão deixar a medicação [metadona, usada para tratar dependentes de heroína] em dois ou três anos. Outros jamais poderão viver sem ela, mas conseguirão progresso em outras áreas de sua vida. Como se mede sucesso?", questiona Linda.

Uma dessas é Katherine, que entrou na Glenwood quando levava Chloe na barriga. Há dois anos ela não usa heroína -a mesma idade da filha, que brinca na creche anexa. Mas continua na clínica, onde recebe metadona e já atende usuários, ajudando-os a pôr a vida em pé.

Loira, 38 e vestida de rosa, ela contradiz o padrão local de usuários, homens negros e jovens. Mas não o histórico: cresceu em família de alcoólatras e sofreu abuso de parentes e do primeiro marido. "E fui horrível com meus dois filhos mais velhos", diz, sem brecha para o assunto.

A espera para Glenwood -que é pública e atende afiliados ao Medicaid, a assistência médica federal aos mais pobres- pode levar três meses. Menos gestantes. Para elas, são 48 horas.

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