Leão Serva
Avanços e retrocessos
Novo sistema de ônibus de SP quer 'metronizar' corredores, mas deixa de lado preocupação ambiental
A Prefeitura publicou na última sexta-feira (3) o decreto com as principais diretrizes para a reestruturação do sistema de ônibus da cidade, a ser implementada ao longo dos próximos meses, para durar pelo menos 20 anos. O transporte público sobre pneus na cidade obedece uma lei de 2001. Para mudar as coisas foi preciso alterar antes a lei.
Agora, em poucos dias, deve ser publicado o edital de concorrência, submetido a consulta pública por um mês. E então, talvez dentro de dois meses, começará a concorrência. É possível, portanto, imaginar que o funcionamento do novo sistema fique para 2016, ano eleitoral.
O que parece ser mais importante: A cidade será redividida. Hoje são oito áreas, nas quais operam 14 empresas concessionárias e 12 cooperativas permissionárias (26 operadores). Agora haverá três níveis de operação, exclusivamente por empresas: "Estrutural", com quatro áreas de corredores; "Articulação Regional", com nove áreas integrando bairros, áreas centrais e corredores; e "Distribuição", com 13 áreas em bairros, operando localmente. No nível "Estrutural" há uma quinta categoria que é a administração das linhas de trólebus.
Passará a haver clara distinção entre as linhas expressas nos corredores e as mais lentas, nos grupos locais ou intermediários. Nos corredores, só andarão ônibus grandes, biarticulados, "metronizados" (com frequência garantida, como metrô), disse o secretário Jilmar Tatto à coluna na sexta, emprestando a palavra criada por Jayme Lerner nos anos 1970. Com isso, saem dos corredores os pequenos ônibus que vêm dos bairros e congestionam a via. O secretário quer que esses grandes ônibus tenham a cor prata, para parecerem de fato com trens.
A coincidência de "vagas" em disputa (26 atuais e 26 mais trólebus no novo modelo) sugere que a competição não deverá ser tão intensa quanto prometiam o prefeito Fernando Haddad (PT) e Tatto no início do ano: houve uma pulverização do sistema, o que exige menos investimentos de cada empresa, garantindo capacidade de participação dos atuais operadores.
Há uma questão importante que parece estar em segundo plano: a emissão de poluentes. A Lei Municipal de Mudanças Climáticas, de 2009, impõe que a partir de 2018 não existam ônibus rodando com combustíveis fósseis. Tatto disse à coluna em 16 de fevereiro que a concorrência exigiria veículos adequados à lei. Na última sexta, já não se mostrou tão convencido: disse que não há oferta de ônibus para atender a demanda da cidade e que a frota tem vida útil de dez anos e as mudanças devem ocorrer quando da renovação dos veículos.
Esse argumento faz sentido, mas a prefeitura não tem exigido aumento no número de carros não poluentes nas últimas renovações. Quanto à oferta de carros, se a cidade, que consome 1.300 ônibus por ano, avisar a indústria mundial que passará a comprar apenas veículos "verdes", muitas empresas se apresentarão com modelos em quantidade. Sem atitudes desse tipo, podemos esperar que em 31 de dezembro de 2017 a prefeitura constate que não há tempo para mudar a frota até 2018.
Também não é bom sinal a criação do grupo "Estrutural" dedicado aos trólebus. O que parece ser benefício (alguém pensando só em ônibus elétrico) é o contrário: os outros 26 lotes da concorrência não terão interesse nesse modelo. O resultado será a manutenção da oferta atual, quando a cidade precisa de expansão.