Haddad infla balanço de metas da Prefeitura de SP
Gestão petista contabiliza etapas burocráticas no índice de desempenho
Entidade que idealizou plano de metas diz que município deveria incluir apenas as obras e ações entregues
É como se houvesse duas cidades sob o comando de Fernando Haddad (PT).
Na versão da São Paulo oficial, a promessa petista de construir 150 km de corredores de ônibus até o final do mandato, em 2016, aparece com 51,9% de avanço.
Na versão real da cidade, no entanto, só foram entregues 2,3 km de corredores, o equivalente a 1,5% da meta.
A diferença entre o divulgado pela prefeitura e o de fato concluído pode ultrapassar 20 vezes em alguns casos.
Essa discrepância ocorre devido ao método utilizado pela gestão Haddad para contabilizar sua performance.
Nele, etapas burocráticas recebem grande peso no índice de desempenho, inflando, com isso, os resultados.
Essa prática, adotada também durante a gestão do antecessor Gilberto Kassab (PSD), era chamada de "maquiagem" por membros da então oposição liderada pelo PT.
A contabilidade adotada atualmente faz com que a situação da habitação na cidade, por exemplo, pareça muito melhor do que de fato é.
O prefeito prometeu construir 55 mil unidades habitacionais. No site em que o cidadão pode acompanhar as metas, o avanço da promessa é de 45,2%. Mas a prefeitura só entregou 4.944 apartamentos (8,9% do total).
O segredo está no jeito como a meta é descrita no site: "obter terrenos, projetar, licitar, licenciar, garantir a fonte de financiamento e produzir 55 mil unidades".
A cada uma dessas etapas é atribuído um peso, possibilitando, por exemplo, que o desempenho chegue a 40% antes mesmo da criação de um canteiro de obras.
Situação parecida ocorre com outras promessas que foram tema da campanha do prefeito, como a construção de creches, dos CEUs (Centros Educacionais Unificados) e de unidades da rede Hora Certa.
CRITÉRIO DIFERENTE
A diferença de critérios adotados na medição também dificulta a vida de quem acompanha o desempenho da administração municipal.
No caso das ciclovias, área na qual a gestão já divulgou a implantação de 238,3 km dos 400 km prometidos, a contabilidade não leva em conta nenhuma etapa burocrática. No site, o andamento aponta diretamente e apenas o índice de 59,6%.
Procurada, a gestão Haddad afirmou à Folha que irá rever a metodologia.
A Rede Nossa São Paulo, entidade que idealizou a lei que estabelece o plano de metas, considera que a Prefeitura de SP deveria contabilizar apenas obras e ações já entregues à população.
"A única diferença de cálculo em relação à gestão passada é que agora a metodologia está mais clara. Considerar todas as etapas pode servir para apontar onde uma meta emperra, mas o que interessa no final são as ações que beneficiam a população", afirma Maurício Broinizi, coordenador-executivo da Nossa São Paulo.
Ele também critica a prática de incluir vários projetos na mesma meta. "Fica mais difícil para acompanhar o andamento. Não é simples padronizar o mesmo critério, ter a mesma metodologia para metas muito diferentes."
"Para o público, ter a creche faz diferença. Não importa se adquiriu ou não adquiriu o terreno", afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV.
Para ele, o cidadão pode ser levado a acreditar que determinadas metas serão cumpridas, mesmo que isso não vá acontecer. Uma forma de evitar isso, diz, seria deixar clara a previsão para a entrega da meta. "E provavelmente a opinião pública vai querer saber por que se priorizou ciclovia e as creches estão andando tão mais devagar."