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'Pinheirinho era um verdadeiro jardim'

Quem afirma é Benedito Bento Filho, o 'comendador', responsável pela venda do terreno a Naji Nahas nos anos 1980

Empresário afirma que área, de onde cerca de 2.000 famílias foram expulsas, era produtiva antes da ocupação

LAURA CAPRIGLIONE
JULIANNA GRANJEIA
ENVIADAS ESPECIAIS A SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

Benedito Bento Filho, 75, fica nervoso e bate na mesa quando ouve alguém dizer que o assentamento do Pinheirinho é um terreno irregular, que teria sido incluído entre os negócios do empresário Naji Nahas à custa de alguma bandalheira.

Há uma semana, cerca de 2.000 famílias pobres foram retiradas à força por tropas da PM e agentes da Guarda Civil Metropolitana, do terreno de 1,3 milhão de metros quadrados, na zona sul de São José dos Campos.

Chegou-se até mesmo a dizer que Nahas teria se apropriado da terra depois de um crime medonho, o massacre de toda uma família alemã, os Kubitzky, em 1969.

"É mentira. Os Kubitzky nem eram daqui. Eu é que comprei essa área, em 1978, da família Lahud, e a vendi ao Nahas. Tudo escriturado. Antes de ser invadido pelos sem-teto, aquilo era lindo, um verdadeiro jardim", diz.

"Comendador Bentinho", como é chamado (diz que o título lhe foi concedido pela Ordem de Cristo), está desde a década de 1950 no epicentro de todos os grandes negócios imobiliários de São José dos Campos. Continua.

Agora mesmo, está construindo um centro de treinamento que habilitará a cidade a se candidatar a uma vaga como sub-sede da Copa do Mundo de 2014.

Ele também tem um terreno, vizinho ao Pinheirinho, em que podem ser construídas 1.200 casas. Torce para que as casas populares que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), anunciou na última quinta, para abrigar os sem-teto do Pinheirinho, impliquem a desapropriação de seu terreno -ele não menciona por quanto.

"Aquilo tudo era meu mesmo", diz o comendador. Mas ele contesta as lideranças dos sem-teto, para as quais o Pinheirinho era terra improdutiva, mantida no seu patrimônio e, depois, no de Nahas, apenas para fins de especulação imobiliária. "O nome, aliás, nem era Pinheirinho. Era Parreiras de São José."

Ali, diz, havia 62 pessoas trabalhando com 32 mil árvores frutíferas. "Eram parreiras de uva Itália, pés de tangerina poncã (a gente até vendia no Ceasa de São Paulo), castanheiros, bananeiras, abacateiros, além de 400 jabuticabeiras e de umas cabeças de gado", lembra.

O terreno, hoje pertencente à massa falida da Selecta Comércio e Indústria, uma das empresas de Naji Nahas, quase virou uma espécie de bairro operário bem antes da chegada dos sem-teto.

Comendador estica sobre a mesa de seu escritório vários mapas com três metros de comprimento -trata-se de estudos de projetos de loteamento. O último a ser aprovado pela Prefeitura de São José dos Campos em 1978, previa a construção de 5.140 unidades habitacionais no terreno de exatos 1.386.207,64 metros quadrados.

Mas o loteamento "Parreiras de São José" não saiu do papel. Em 83, a prefeitura mudou o zoneamento urbano e transformou o pedaço em zona industrial. Segundo a prefeitura, a mudança deveu-se à consideração de que a área tem vocação industrial. Nenhuma empresa, contudo, quis lá se instalar. Em 2004, os sem-teto quiseram. E ficaram até domingo passado.

O advogado da massa falida da Selecta, Waldir Helu, diz ignorar que destino terá o terreno, agora um imenso mostruário de entulhos. Corretores de imóveis dizem que, assim, vale R$ 200 milhões.

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