Crise da água
Grande SP teria 51% mais água se gestão Alckmin tivesse agido antes
Com ações como sobretaxa e bônus desde janeiro de 2014, Grande SP teria 238 bilhões de litros a mais
Especialista defende a adoção de gatilhos contra nova crise; governo afirma que ações tiveram resultados graduais
A Grande SP poderia ter 51% a mais de água em seus reservatórios se o governo Geraldo Alckmin (PSDB) e a Sabesp, empresa paulista de saneamento, tivessem adotado desde o início da crise hídrica as medidas de controle de consumo hoje em vigor.
O cálculo foi feito pela Folha com base em dados da Sabesp que mostram a economia de água obtida com quatro medidas: bônus na conta para quem economiza; sobretaxa para quem aumenta o gasto; corte da venda de água para municípios onde a Sabesp não atua; e redução de pressão, que raciona o volume de água nas torneiras.
Se todas essas ações tivessem sido tomadas em janeiro de 2014, quando a crise já dava seus primeiros sinais, a região metropolitana teria poupado 238 bilhões de litros em seus reservatórios.
O volume equivale a uma vez e meia toda a água hoje no Cantareira, manancial em nível crítico desde o ano passado –na sexta-feira (28), estava em 12,2%, incluindo as duas cotas do volume morto.
O governo diz que as ações tomadas tiveram resultados graduais e que o cálculo é "descabido" (leia na pág. 3).
MEDIDAS
No início do ano eleitoral de 2014, o Cantareira, principal manancial da Grande SP, tinha 27% da capacidade –sem considerar o volume morto, que nunca havia sido usado–, e o clima estava atipicamente seco. As chuvas eram as piores em 84 anos.
A primeira medida anunciada pelo governo foi o bônus por economia de água, em fevereiro de 2014. A princípio restrita à área do Cantareira, foi estendida a clientes de outros mananciais em abril.
Naquele mês, o governo já tinha autorização da agência estadual de saneamento para aumentar em 5,4% a conta de água em São Paulo. Mas escolheu não fazê-lo.
Ao longo do ano, Alckmin foi questionado por adversários políticos que o acusavam de retardar medidas impopulares por causa da eleição –o que o tucano sempre negou. Ao mesmo tempo, especialistas cobraram medidas para punir o desperdício de água.
Entre os críticos, estava o hidrólogo Jerson Kelman –que, em 2015, assumiu o cargo de presidente da Sabesp, posto que ainda ocupa.
Em entrevista ao jornal "Brasil Econômico" em novembro do ano passado, Kelman disse que quem aumentasse o consumo de água em São Paulo deveria pagar mais.
Afirmou que as eleições haviam diminuído a clareza das informações transmitidas à população. "Sob o ponto de vista do interesse público, a atuação não foi a melhor, desperdiçou-se água", afirmou.
O reajuste na conta de água só seria implantado em dezembro. No mesmo mês, o governador solicitou a implantação da sobretaxa na conta.
Outras duas medidas foram adotadas gradualmente pelo governo do Estado.
A principal é a redução de pressão da água. Usada desde 1997, passou a ser aplicada com mais intensidade em março de 2014 e ampliada mês a mês. Atualmente, é responsável por 54,4% do volume economizado (veja quadro na pág. 3). Ao mesmo tempo em que reduz vazamentos, causa falta de água à noite, principalmente em bairros altos.
Outra iniciativa foi a redução do envio de água a municípios em que a empresa não atua como concessionária, como Guarulhos e Santo André.
Para o hidrólogo e professor da Unicamp Antônio Carlos Zuffo, o governo do Estado demorou para tomar medidas mais rígidas. Ele sugere a adoção de um sistema de "gatilhos": quando a situação atingir um nível de gravidade, ações de economia são automaticamente adotadas.
Já a urbanista Marussia Whately, da ONG Aliança pela Água, defende a elaboração de um plano de contingência para a crise. O Estado e a Sabesp negam a possibilidade de rodízio de água em 2015.