O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.
Estação ventania
Corrente de ar na estação Fradique Coutinho embola cabelos e levanta saias; Metrô diz que fenômeno é comum em instalações subterrâneas
Dezesseis metros abaixo do asfalto quente da rua dos Pinheiros, em São Paulo, uma brisa bagunça os cabelos e levanta as saias das transeuntes, que se sentem "em uma propaganda da Pantene", com os cabelos ao vento, ou como Marilyn Monroe tentando segurar o vestido.
Essa ventania fica dentro da Fradique Coutinho, estação de metrô da linha amarela inaugurada no fim do ano passado entre as paradas Paulista e Faria Lima.
Concentrado nas escadas rolantes dos dois lados –tanto em direção à Luz, quanto ao Butantã–, o vento chega a balançar a placa que indica a saída da plataforma.
A estudante Maria Fernanda Liuti, 14, que citou a marca de produtos de cabelo, disse "amém" por não estar usando vestido na quinta-feira (8), quando passou pela estação e teve seus longos fios negros bagunçados.
Já outra menina aproveitou para fazer "a diiiva" (em suas palavras), balançando os cabelos como se estivesse num clipe de música em frente a um ventilador. Ela postou no Twitter um vídeo feito em abril na plataforma.
Na mesma rede social, um passageiro diz que a estação poderia abrigar uma usina de energia eólica; outro divide os paulistanos em dois tipos na Fradique: "Os que se incomodam com o vento e os que agem como a Beyoncé".
O Metrô de São Paulo comenta a ventania nas paradas, sem abordar especificamente a Fradique.
Segundo a empresa, há dois fatores para o deslocamento de ar: o "efeito pistão", causado pela movimentação dos trens, e o sistema de ventiladores de grande porte, instalados para higienizar o ambiente com trocas de ar.
"Comum em instalações subterrâneas, o fenômeno dos 'ventos' em certos trechos das estações é conhecido e previsto antecipadamente nos projetos do Metrô de forma a se situar em patamares adequados ao conforto humano", diz a instituição.
Outros usuários relatam sentir a ventania também nas estações Paulista, São Joaquim e São Judas.
Paulo Jabor, pesquisador do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) e engenheiro mecânico especialista em aerodinâmica, concorda com a justificativa do metrô e diz que o vento pode ser mais forte na Fradique porque essa estação é menor que outras, deixando menos espaço para o ar se dissipar.
Ele chuta que a velocidade do vento nas curvas dos corredores que levam às escadas chega a 3 ou 4 metros por segundo. "Onde afunila, a velocidade fica mais alta", diz.
Para efeito de comparação, corridas de 100 metros rasos só aceitam, para a obtenção de recordes, a velocidade do vento de até 2 metros por segundo –mais que isso pode favorecer o corredor, caso ele esteja na mesma direção que a corrente de ar.
"O trem tem uma baita potência elétrica. No fim do dia, aquilo vira calor. É preciso renovar o ar", afirma Jabor. Para o pesquisador, o vento forte é tecnicamente melhor que o contrário, que pode deixar o ar sujo e as pessoas suando.
'DELICIOSO'
Há 60 anos, a imagem de Marilyn Monroe segurando o vestido se eternizava –o vento que vinha do metrô abaixo das grades onde ela pisava, na rua, era tanto que descobria suas pernas e quase fazia o tecido tapar seu rosto.
A cena é parte do filme "O Pecado Mora ao Lado" (1955), de Billy Wilder, e foi gravada inicialmente em Nova York, de madrugada, cercada de fãs e fotógrafos. "Sente a brisa do metrô? Não é delicioso?", diz Marilyn.
Na São Paulo de 2015, a estudante Amanda Silbr, 18, se lembra da cena. Abordada na estação Fradique, ela diz: "Tem que ficar tipo assim [segura a saia], meio Marilyn Monroe". "É refrescante, mas sempre que estou com roupas largas, ficam voando. Quando está frio, é desconfortável."
Claudia dos Santos, 22, diz que sai de casa "já pensando na roupa, senão fica 'embaçado'". Ela usava calça e camiseta ao passar pela estação, na quinta-feira (8).
O termômetro marcava 36º quando o estudante Fábio Almeida, 21, desceu as escadas rolantes de costas, encarando o vento que vinha de cima. "Está muito calor, ajuda a se refrescar."
Já Manuela de Oliveira, 4, foi carregada "de cavalinho" pelo pai enquanto balançava os braços, como se estivesse voando, e sentia a brisa da estação Fradique no rosto.