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'Ela era adorável', diz mãe de Gabriella

Silmara Nichimura, mãe da jovem que morreu no Hopi Hari, conta sobre a filha e os últimos momentos antes da queda

A família, que mora no Japão, não vinha ao Brasil havia nove anos; sonho de Gabriella era ser jornalista

MORRIS KACHANI
DE SÃO PAULO

"Tá todo mundo travado na cadeira?", perguntou a mãe. "Táááá", responderam juntas a filha e a sobrinha.

Essa seria a última vez em que a mãe escutaria a voz da filha. Silmara Nichimura só reencontraria sua Gabriella estatelada no chão, depois de ter sido arremessada de uma altura de 25 metros em um brinquedo no parque Hopi Hari, no último dia 24.

"Naquele momento, pensei: vou orar. Dei minha mão, mas ela não estava segurando. Achava que só um milagre faria ela levantar", lembra Silmara.

"Alguém ainda apareceu e tentou reanimá-la. Quando levantou a cabeça de minha filha... Meu Deus, é algo que nunca vou esquecer."

VISITA

Os Nichimura vivem no Japão, na província de Shizuoka (região central do país), há 19 anos. Não vinham ao Brasil havia nove.

Armando, 45, filho de mãe japonesa e pai brasileiro, é natural de Itaporã, em Mato Grosso do Sul. Silmara, 38, é de Guarulhos (Grande SP).

As filhas Gabriella, 14, e Hannah, 7, nasceram no Japão, estudaram em colégio público e mal falam português. "Sobre o Brasil, Gabriella pensava a mesma coisa que a maioria dos japoneses: Amazonas, Rio de Janeiro, Cristo Redentor, futebol."

A família chegou ao Brasil no dia 7 de fevereiro com um propósito. "Meu pai está passando por um momento delicado de saúde e decidiu partilhar seus bens entre os quatro filhos", explica Armando. "Por isso viemos às pressas."

Passadas duas semanas, para quebrar a rotina em Guarulhos, decidiram organizar uma visita ao Hopi Hari. Esperaram o Carnaval passar e escolheram a sexta, 24.

De Guarulhos até Vinhedo, perderam-se no caminho e chegaram ao parque por volta das 9h30. Além dos pais e de suas duas filhas, foram também Adalgisa, irmã de Armando, e a filha dela, da mesma idade de Gabriella.

O primeiro brinquedo visitado foi a La Tour Eiffel. "Gabriella estava totalmente feliz no parque. Eu ainda observei que ela estava sem cinto, apenas com a trava, mas ouvi uma voz de um funcionário dizendo: 'É seguro'", diz a mãe.

Em um primeiro momento, presos ao eixo, os assentos, onde se sentaram o pai, a mãe, Gabriella e sua prima, subiram até o topo da torre, que tem 69,5 metros. No alto, eles ficaram parados por dois segundos. Depois despencaram em queda livre, atingindo uma velocidade de até 94 quilômetros por hora.

Foi enquanto o brinquedo freava que Silmara diz ter escutado um barulho muito alto. "Era minha sobrinha, que gritou até perder a voz", conta. A pequena Hannah acompanhava tudo de baixo, ao lado da tia. Ficou desesperada ao ver a irmã no chão.

O parque, fechado para perícia, reconheceu depois que houve uma "grande falha".

'ALEGRE'

Silmara só abre um sorriso bonito, de orgulho, ao lembrar a vida que a filha levava. "Era uma criança adorável. Doce, meiga, alegre. Tinha muitos amigos, e duvido que haja uma pessoa no mundo que não gostasse dela."

A vida da família no Japão era muito associada às atividades da Igreja do Evangelho Quadrangular. Gabriella era muito ativa na comunidade -tocava piano, participava dos coros, dançava nas festas.

Conta a mãe que, além da Bíblia, lia mangás e era viciada em um desenho animado chamado "Nintamá".

Mantinha ainda um perfil no Ameba, espécie de rede social japonesa feita de avatares. Andava com fones no ouvido, escutando música evangélica ou japonesa teen.

Não tinha namorado, pois, seguindo orientação dos pais, dizia que só embarcaria em um relacionamento se houvesse compromisso de casar.

O sonho de Gabriella era ser jornalista e viver em Tóquio. Os pais não pensavam em voltar ao Brasil -apenas, quem sabe, quando se aposentassem. Com sua morte, estão reconsiderando.

"Uma coisa eu aprendi", diz Silmara. "Aquilo que você acha que só vai acontecer com os outros, um dia pode acontecer com você. E aconteceu comigo."

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