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Sertanejo tem máquina de lavar, só que falta água

Aumento da rede de saneamento foi menor que o avanço de renda no NE

Sem água encanada, casas têm aparelhos como TV de LCD; renda subiu 42% e rede de saneamento, 6,9%

FÁBIO GUIBU
ENVIADO ESPECIAL A PARANATAMA (PE)
DANIEL CARVALHO
DE SÃO PAULO

O descompasso entre a implantação de infraestrutura hídrica no semiárido nordestino e o crescimento da renda dos seus moradores fez surgir na região vítimas da seca que não têm água encanada, mas moram em casas com antenas parabólicas, TVs de LCD e até máquinas de lavar.

Segundo a FGV (Fundação Getúlio Vargas), a renda no Nordeste cresceu 42% entre 2001 e 2009. Já o número de domicílios com água encanada na zona rural aumentou apenas 6,9% entre 2000 e 2010, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Para o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), o descompasso resulta de "anos sem política de sustentabilidade hídrica".

Numa região onde apenas 35% dos domicílios rurais são ligados à rede de distribuição, a solução no período de estiagem são ações emergenciais. Só com carros-pipa, o governo federal vai gastar neste ano R$ 164,6 milhões.

CISTERNA E GELADEIRA

"Já passei por muitas secas, andava dois quilômetros para buscar água com o pote na cabeça", disse o agricultor aposentado Serafim Raimundo da Silva, 76, morador da zona rural de Paranatama, no agreste de Pernambuco.

"Hoje ainda não tenho água de cano [encanada], mas se quiser água gelada é só tirar da cisterna e colocar na geladeira", afirma ele.

O agricultor mora na mesma casa desde criança. Era de taipa, virou de madeira e agora é de tijolo, conta.

No telhado, uma antena parabólica divide espaço com um sistema de coleta de água da chuva. Na sala, há uma TV de LCD e, no quintal, a máquina de lavar roupa funciona com água de balde.

Da estrada que liga Paranatama à divisa com o Estado de Alagoas, é possível ver o brilho de outras parabólicas. Ao lado das casas, quase sempre há uma cisterna.

"Pegar água do barreiro virou coisa do passado", diz a agricultora Terezinha Leite da Silva, 55, que mora em Bom Conselho (PE).

"Antigamente, a gente era obrigada a coar a lama para beber [a água]", lembra ela. "Agora, ainda não tem água de torneira, mas a represa é só para lavar roupa e os animais", diz Terezinha.

Ela nasceu na região e morou em um barraco de taipa, no mesmo lugar onde ergueu sua casa de tijolos. Por três anos, recebeu o Bolsa Família, período em que financiou o armário onde guarda os eletrodomésticos.

O carro-pipa visita a região a cada 15 dias. Mas, se o reservatório esvazia antes disso, ela divide os R$ 60 que paga por uma carga d'água com a vizinha, Maria Ferreira, 25.

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