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Barbara Gancia

Onde estão os ricos?

O rico de verdade não se deixa impressionar: vai ao restaurante Fasano e pede uma omelete

MUITA GENTE ficou surpresa nes­ta semana com a revelação que o consagrado grupo Fasano, cujo padrão de excelência é reconhecido no país e até fora, já es­teve à beira da falência. E o que mais chocou foi saber que o comandante do negócio, Rogério Fasano, dono de um estilo que lamentavelmente vai pelo mesmo caminho que o urso-polar e o tigre de Bengala, não vive a "dolce vita" que seu tipo infere. Ele mesmo admite correr de lá para cá para fechar o mês e pagar aluguel como qualquer rosamundo des­dentado no ponto de ônibus.

Em um mundo habitado por oli­garcas russos e pelos monstrengos produzidos pelo tal "mercado", Rogério só é rico para sequestrador português (atenção, colônia: isso foi uma PIADA). Sujeito leva em­bora imaginando que vai receber uma fortuna em troca e, na hora de negociar, se dá conta de que os pa­rentes fazem "Família americana vende" para pagar dívidas.

É evidente que isso foi uma frase de efeito, uma "boutade". Como tam­bém é verdade que Rogério exage­rou nas tintas quando falou de si.

Imagino que isso se deva ao seu sangue escandinavo do qual, por si­nal, eu compartilho. Por isso mesmo, en­tendo perfeitamente sua incapaci­dade viking de se deixar levar pelas emoções. De Trieste a Nápoles.

Fato está, que hoje ninguém mais sabe dizer quem é rico. Quando vo­cê menos espera... Paf! Tome um ri­co a lhe cruzar o caminho enfiado nas vestes de um São Francisco de Assis. E você nem percebe. Isso é para você aprender a parar de per­der a vida diante da vitrine do Er­menegildo Zegna no shopping, está vendo só? Lá foi ele com a calça toda rota e jeito de quem compra vi­nho de garrafão, enquanto você na­mora uma bolsa de grife feita com mão de obra explorada, pela qual você nunca poderá pagar.

Na Idade Média, como dizia o Monty Python, rico era aquele que não estivesse coberto de esterco. Quando observamos fotos anti­gas do Rio de Janeiro e de São Paulo temos a impressão de que todos eram bem mais abonados. Não é o que aponta o IBGE, a renda per capita aumentou significativamente de lá para cá, mas a percepção nos trai.

Tome as fotos da final da Copa de 50. Toda vez que vejo imagens da arquibancada do Maracanã naque­le Brasil x Uruguai sou tomada por uma nostalgia não sei bem do que, uma vez que eu nem sequer existia naquele tempo. Não há ali uma só pessoa com camisa de time, nin­guém despenteado ou de chinelo.

Mostre-me um que não esteja de calça de tergal e cinto ou de camisa de linho. Parece cerimônia de for­matura. O que foi que aconteceu de lá para cá? Inventaram uma liqui­dação perene de bermudas horren­das? Desativaram por decreto o termo impecável?

Até na novela misturou o que é C, CC, AAA... Aliás, classe social é por dinheiro ou escolaridade? Como é mesmo que as pesquisas medem isso?

E olha que eu sempre usei parâ­metros bem definidos para não me deixar enganar. Quando entro no Fasano, bastou uma olhada no sa­lão e eu já saberei dizer onde estão os ricos. Pode apostar. Mesmo por­que o Fasano é disposto como um Arábia grã-fino. Entrou, olhou, avistou tudo na hora.

Quem não estiver comendo trufas e tomando vinho Petrus é rico. Acredite. O rico de verdade come essas coisas excelentes em casa. O rico, mas rico mesmo, estará co­mendo uma omelete.

Existe afirmação mais enfática contra se deixar impressionar do que comer uma fritada de ovos em local em que trufas brancas vindas diretamente da região de Alba es­tão ao alcance das papilas gustati­vas?

barbara@uol.com.br

AMANHÃ EM COTIDIANO
Walter Ceneviva

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