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Ex-alunos de escola estadual que foi a pior de SP escrevem livro e vão à Bienal

EMILIO SANT’ANNA
DE SÃO PAULO

Nos corredores apinhados de gente, Sandra Modesto, 34, é uma entre as dezenas de professores que visitam a 22ª Bienal do Livro de São Paulo, no Anhembi, na zona norte.

Poderia estar ali conduzindo mais uma excursão escolar, não fosse ela mentora e mecenas de um grupo de escritores. Ao seu lado, Luan Cardoso, 17, Matheus Mendes, 16, e Paulo Giordano, 15, autores de três livros, dois dos quais já lançados.

Realidade bem diferente de quando, em 2008, eram alunos da então pior escola de todo o Estado de São Paulo, segundo o Idesp (índice de avaliação do governo).

Naquele ano, o desempenho da Escola Estadual Professor Sérgio da Costa, no Tremembé, zona norte, não chegou a deixar Sandra -que já lecionava ali desde 2005- surpresa. "Quando saiu o resultado, foi um caos. Os pais nos procuravam para dizer tirariam os filhos da escola e não tínhamos o que dizer."

A RESPOSTA É NÃO

O que a surpreendeu mesmo foi um aluno do 6º ano que a procurou numa manhã com uma redação nas mãos. Então com 12 anos, Luan queria saber se teria chance de publicar seu texto -repleto de referências sobre seu universo, de mangás e heróis japoneses- no jornalzinho da escola. Não, foi a resposta.

"Disse a ele que a história era muito boa e que poderia ser mais, que poderia pensar num livro. Ele me olhou e disse: 'Essas coisas não acontecem com a gente'."

Em menos de um mês, porém, começou a acontecer. Sem ter muito o que oferecer ao aluno, Sandra lhe deu um caderno e a ajuda de outros três colegas da escola: Matheus, Paulo e Thaís -que há um ano saiu do grupo.

Assim, "a oito mãos", e com a ajuda de Sandra nasceu "O Segredo dos Amuletos". A história é a narrativa fantástica da trajetória de um adolescente que se descobre portador de um amuleto "capaz de destruir ou salvar o mundo"; tudo bem ao gosto dos próprios adolescentes.

Foram três meses de escrita, revisões e correções. "Eles iam passando um caderno de mão em mão e, no final, eram 186 páginas", diz Sandra.

O livro despertou a atenção de outros alunos da escola, mas tinha tudo para ficar só nisso, não fosse a Professor Sérgio da Costa ter superado a meta estabelecida para a avaliação do ano seguinte.

O resultado no Idesp rendeu aos professores um bônus pago pelo Estado. Sandra recebeu R$ 4.000. Casada, três filhos, ela tinha planos para o dinheiro: imprimir mil exemplares do livro. Gastou o bônus e mais R$ 1.000.

"Era um sonho que poderia ficar na gaveta", diz Luan. "E virou a maior realização da minha vida."

SONHO

Filho de uma costureira e de um segurança, o garoto hoje sonha em ser cineasta.

Sandra, que hoje é coordenadora em outra escola, quer investir em seus escritores. O segundo livro, "O Segredo dos Amuletos - Testando Todos os Limites", ganhou tiragem de 500 exemplares paga pela Secretaria da Educação e foi distribuído em escolas.

Assim como Luan, Matheus e Paulo já não são alunos da escola. Matheus quer ser jornalista. Já Paulo pensa em ser professor.

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