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O clone

Donos bichos buscam laboratórios para guardar células de animais, na esperança de cloná-los no futuro

RICARDO GALLO
DE SÃO PAULO

Karla Matias, 25, sofre só de pensar que a yorkshire Sandy, 15, tem no máximo mais dois ou três anos de vida. Foi então que decidiu: quer tentar cloná-la.

Bióloga, Karla pesquisou na internet até encontrar uma empresa que congelasse células em nitrogênio. Achou uma, em Mogi Mirim (interior de São Paulo), que trabalha com clonagem de bovinos.

Em seguida, propôs à empresa que armazenasse as células do animal. "Pensei em tentar aumentar a expectativa de vida da Sandy e, no futuro, vir a fazer um clone."

A empresa aceitou, mas deixou claro que não conseguiria dar prazos nem garantias. Karla topou mesmo assim: pagou R$ 2.000 pela retirada e armazenamento das células, mais um salário mínimo (R$ 620) a cada ano que o material ficar congelado.

ESPERANÇA

Não é um caso único. Donos de cães e gatos têm procurado laboratórios especializados em reproduzir bovinos na esperança de um dia clonarem seus bichinhos.

A Invitro Brasil, a empresa que Karla procurou, tem cerca de 20 "linhas celulares" (o nome dado) de cães, guardadas a 196 graus Celsius negativos.

"O perfil é de pessoas apaixonadas pelos bichinhos de estimação, que têm esses animais como membro da família e querem eternizar", diz a diretora Perla Fleury. O negócio da Invitro, afirma, é reprodução bovina. Atender aos donos de pets foi um modo de dar conta dessa demanda.

Na Faculdade de Zootecnia da USP de Pirassununga, no interior paulista, há 15 linhas celulares de cães e gatos.

Foram os donos que procuraram o laboratório, diz Flávio Meirelles, professor associado da instituição, que não cobra nada pelo serviço.

A "colheita" consiste em retirar um pedaço de pele do animal. Se o bicho morreu, as células têm de ser colhidas nas primeiras horas.

Outros dois laboratórios dizem ter sido procurados por donos de animais, mas que ainda não prestam o serviço.

A clonagem de cães e gatos levará entre cinco e dez anos para ocorrer, estima Perla Fleury. Do ponto de vista tecnológico, a medida é possível; a dúvida é se há interesse comercial no negócio.

A implantação também exigiria criação de uma lei.

Uma empresa da Coreia do Sul faz clonagens de pet. À Folha, o responsável disse ter sido procurado por um brasileiro interessado. Nos EUA, há, como aqui, serviços para armazenar as células.

Um cachorro clonado terá só a aparência idêntica ao original; a personalidade, não, diz Rosângela Ribeiro, gerente de programas veterinários da WSPA (Sociedade Mundial de Proteção Animal) no Brasil e especialista em bioética. "Ele não substituirá o outro."

As taxas de mortalidade em clonagem são altas, e o animal clonado pode apresentar envelhecimento precoce, diz. "E há milhares de animais abandonados. O dono, depois que o seu animal for embora, pode transmitir esse amor para outro."

Karla afirma que, se a Sandy versão clonada tiver outra personalidade, será "um pouco frustrante". O que a levou a tentar espichar a vida da yorkshire é o fato de Sandy ser "leal e companheira" nos 15 anos de convivência.

O Conselho Federal de Medicina Veterinária informou ser contra clonar pets quando a razão é o afeto. O órgão é favorável à clonagem para fins de pesquisa.

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