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Análise

Quem tem menos prazer e lazer quer mais é destruir o prazer do outro

ELKO PERISSINOTTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Viver em condomínios não difere em nada da vida em família, no trabalho, no lazer.

Os desentendimentos dizem respeito ao campo da cultura, da civilização, da história do homem e de seu tempo.

Barulhos de quaisquer espécies, intensos ou pequenos ruídos, verdadeiros ou imaginários, ativam nossos focos de ira e intolerância; podemos dizer, egocentrismo e autoritarismo, ou ainda, narcisismo narcotizado com autoamputação existencial e inveja.

Pouco importa se a festa do vizinho é escandalosa ou bem comportada, se é antes ou depois das 22h, o fato é que quanto menos prazer e lazer temos na vida, mais temos que destruir o do outro.

Pior ainda, se forem jovens e mulheres bonitas festejando, pois aí nos vem a imagem da maconha e do bacanal que nunca tivemos; "toda uma vida que poderia ter sido e que não foi" (Manuel Bandeira).

Nem sei se deveríamos falar das grandes importunações, uma vez que a falta de limites e respeito é tão óbvia que tangencia o comportamento psicopático perverso.

Mas o que dizer das queixas do barulho do salto alto da moça do andar superior que está chegando de uma festa, ou mesmo indo para o trabalho? Quantos segundos dura esse ruído (invejado) entre o quarto e a porta de saída?

Os maus-tratos da solidão e do inexorável sofrimento humano nos deixam enlouquecidos e quem paga a conta de nossas contradições é sempre o vizinho.

Qualidade de vida sem pequenos ruídos (mesmo os das profundezas do inconsciente) não existe.

ELKO PERISSINOTTI é psicanalista, psiquiatra e vice-diretor do Hospital-Dia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

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