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COMÉRCIO
Fim da medida, que impedia ações contra subsídios, deve acirrar disputas
"Cláusula da paz" da OMC chega ao fim
FRANCES WILLIAMS
DO "FINANCIAL TIMES"
Quando a conferência ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio) fracassou, em
setembro, em Cancún, desapareceu com ela qualquer chance de
renovar a "cláusula de paz", que
ao longo dos nove últimos anos
protegeu os subsídios agrícolas
dos países ricos contra contestações na organização.
Sob a "cláusula de paz", que valia até o ano passado, subsídios
que de outra forma poderiam ser
julgados ilegais sob as regras da
OMC estavam protegidos contra
contestação desde que atendam
aos compromissos nacionais de
redução de subsídios negociados
na Rodada Uruguai (1986-94).
Os especialistas em comércio
advertem que a União Européia e
os EUA, os maiores praticantes de
subsídios, podem enfrentar um
dilúvio de queixas na OMC, com
o algodão, arroz, laticínios e açúcar no alto da lista de alvos potenciais.
Isso acarretaria o risco de sobrecarregar o mecanismo de resolução de disputas da OMC e agravaria as tensões no comércio internacional em um momento em
que os negociadores estão tentando desesperadamente recolocar
nos trilhos a Rodada Doha de negociações comerciais, que está paralisada. Uma sequência de disputas "envenenaria o clima das
negociações", disse Franz Fischler, comissário da Agricultura da
União Européia, em outubro.
Essas advertências podem ter sido levadas a sério "Não acho que
veremos uma inundação de processos depois de 1º de janeiro",
disse um advogado especializado
em comércio especial, em Genebra. Outro diz que não está ciente
de qualquer caso em preparação.
David Spencer, embaixador da
Austrália na OMC, afirma que seu
país, que lidera o Grupo de
Cairns, englobando 17 países exportadores de produtos agrícolas,
"ainda está estudando a questão".
"Não chegamos a qualquer decisão, favorável ou negativa."
Brasil e Argentina, dois outros
exportadores agrícolas importantes, também parecem estar adotando uma abordagem cautelosa.
Os negociadores comerciais
afirmam que a questão envolve
não só julgamentos políticos, mas
também incertezas judiciais em
uma área em que a jurisprudência
da OMC ainda não foi testada.
Advogados discordam quanto à
data de vencimento da "cláusula
da paz". Até recentemente, a suposição era de que expirasse em 1º
de janeiro de 2004, nove anos depois da entrada em vigor do tratado agrícola da OMC. Mas o acordo define "ano" como o "o ano
calendário, ano financeiro ou ano
de marketing" especificado pelo
país em seu compromisso.
Já que a União Européia e os
EUA usam anos de marketing em
seus acordos, alguns advogados
argumentam que a "cláusula da
paz" para commodities importantes como os grãos e os laticínios expira na metade de 2004.
Os advogados especialistas em
comércio internacional esperam
que a maioria dos casos, uma vez
que se materializem, seja apresentada sob uma seção do acordo da
OMC quanto a subsídios que as
refere a "sério prejuízo" aos interesses de um país por exemplo,
casos em que um rival deprima
preços ou expulse produtos de
um mercado interno ou de exportação. Até agora essa seção jamais
foi testada numa disputa agrícola.
Olho no Brasil
Isso está prestes a mudar, com
um caso aberto pelo Brasil em
2002 alegando "sério prejuízo"
em função de subsídios norte-americanos ao algodão.
O Brasil argumentou que a
"cláusula da paz" não se aplica
nesse caso porque os subsídios
anuais norte-americanos aos
plantadores de algodão, entre
US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões, excedem amplamente os níveis de
compromisso estipulados como
máximo permitido em 2002.
O veredicto do painel da OMC
sobre o algodão, que sai no segundo trimestre, deve ser crítico para
as futuras contestações a subsídios. "O quanto será difícil provar
que houve prejuízo?", pergunta
um advogado. "Seria temerário
para os países correrem com casos desse tipo antes de saberem de
que forma as regras serão interpretadas."
Mesmo que o exemplo brasileiro abra o caminho, pode não ser
fácil para outros países demonstrar "sério prejuízo" quando, como agora, os preços das commodities estão em alta. "As disputas
talvez tenham de esperar uma
queda nos preços", argumenta
outro advogado.
Com a perspectiva de um litígio
prolongado e de custos judiciais
pesados, não admira que os países
estejam hesitando. Ainda assim,
muitos especialistas em comércio
acreditam que o simples potencial
de queixas à OMC depois da expiração da "cláusula da paz" aumentará a pressão por cortes mais
profundos nos subsídios agrícolas, na Rodada Doha.
Escrevendo no "Journal of Economic Law", Richard Steinberg e
Tim Josling concluem: "Em última análise, o vencimento da
"cláusula de paz" terá o efeito desejado: estimulará as negociações
sobre os subsídios agrícolas que
distorcem o comércio internacional".
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