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FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL
Davos joga esperanças para o G20
Para ministra francesa, próxima cúpula precisa indicar a líderes mundiais "3 ou 4 ações" a implementar
"Todos sabemos que nada sabemos", conclui debate da elite econômica mundial sobre desdobramentos da crise financeira global
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS
O fórum de Davos começou
sob o ambicioso título geral de
"Moldando o mundo pós-crise". Termina hoje com a melancólica constatação de Martin
Wolf, principal colunista do
"Financial Times", o jornal que
todo mundo lê em Davos e também nos gabinetes oficiais do
planeta, especialmente os europeus:
"Todos sabemos que nada sabemos", disparou Wolf em
meio a uma sessão dedicada ao
"Panorama Econômico Global".
Poderia ser apenas mais uma
tirada do humor geralmente
cáustico que Wolf utiliza regularmente. Mas a frase surgiu
depois que Peter Sands, executivo-chefe do grupo financeiro
britânico Standard Chartered,
afirmou:
"Se me perguntarem onde
estamos [na crise], eu responderei não sei".
Já era assim no primeiro dia,
a quarta-feira, quando, em mesa com propósito idêntico, Trevor Manuel, o ministro sul-africano do Tesouro, afirmou que o
grande desafio era saber o que
de fato acontecera.
Essa situação de navegação
no escuro foi reafirmada ontem
por outra ministra de Economia, a francesa Christine Lagarde, para quem o mundo
"passou os últimos três meses
navegando no escuro, sob a
ameaça de colapso".
Três meses é uma referência
a setembro, o mês em que quebrou o Lehman Brothers, o que
pôs o colapso no horizonte.
Christiane Amanpour, a repórter-estrela da CNN, trasladou a questão do "nada sabemos" ao primeiro-ministro britânico Gordon Brown, por ela
entrevistado ontem no plenário do fórum de Davos. Brown
não foi tão contundente quanto
seu conterrâneo Sands, mas
não deixou de dizer que se tratava da "primeira crise financeira global" e que, por isso,
"não havia experiência anterior" que pudesse iluminar a
escuridão vista por Lagarde.
A bem da verdade, não é que
Davos -ou seja, a elite econômica, governamental e empresarial do planeta que se reúne
todo janeiro nessa cidadezinha
dos Alpes suíços- nada saiba.
Sabe o que o mundo sabe. O seguinte:
1 - É uma crise bancária global, como repetiu ontem Gordon Brown. Ou, como prefere
George Soros, o colapso do sistema financeiro.
O que fazer? "A maior prioridade é restaurar a confiança no
sistema, acima de tudo entre os
próprios atores do sistema financeiro", responde Lagarde.
"É difícil", retruca o banqueiro Sands, exatamente porque
ele -como tantos outros- não
sabe onde está. "Mas sei que
não gosto de onde estou", completa.
2 - É preciso que a cúpula do
G20 marcada para 2 de abril em
Londres emita sinais claros,
"sinais que têm que ser vendáveis à opinião pública, o que
não é fácil quando os temas são
CDS (o mecanismo financeiro
chamado "credit default
swap") ou Basileia 1, 2 ou 3 (as
regras sobre bancos decididas
nessa cidade, também suíça,
onde fica o Banco de Compensações Internacionais, o banco
central dos bancos centrais)",
diz a ministra francesa.
Quando se conversa sobre assuntos tão áridos, "três quartos
da audiência desiste de prestar
atenção", diz Lagarde.
A cúpula do G20, o grupo das
20 maiores economias do mundo, está se transformando numa espécie de porta da esperança para todos os que navegam no escuro, na expectativa
de que ela será o facho de luz
que tudo iluminará.
Não será, assim, claro, mas
Christine Lagarde torce, pelo
menos, para que os líderes "voltem para casa com três ou quatro ações que possam dizer que
vão implementar".
Endosso de Roubini
Montek Ahluwaya, presidente da Comissão de Planejamento da Índia, brinca que não basta que o público compre as decisões a serem adotadas pelo
G20 sobre a nova arquitetura
financeira global.
"É preciso que Nouriel Roubini as endosse", ironizou, referindo-se ao economista conhecido como Mr. Apocalipse que
não só previu a crise antes que
todos como passa o dia todo criticando todos os pacotes até
agora lançados em todos os países do mundo.
"É uma corrida contra o tempo", adverte Lagarde, até porque ela coloca no horizonte
imediato o risco de descontentamento social, que aliás começa a pipocar na Europa.
Ou, posto de outra forma,
uma questão que era financeira
e virou econômica, pela contaminação do setor real da economia com o crédito estrangulado, começa a caminhar na direção da política.
Fica fácil, nesse ambiente escuro e crítico, entender que outros "Roubinis" estejam aparecendo, fora da área da adivinhação econômica. Caso, por
exemplo, de Kishore Mahbubani, reitor da Escola Lee Kuan
Yew de Política Pública (Cingapura), para quem está no horizonte "o fim da dominação ocidental do mundo".
Esse tipo de afirmação grandiloquente é comum nos fóruns sociais como o de Belém.
Que surja também em Davos é
um claro sinal dos tempos.
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