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ROBERTO RODRIGUES
Lucros ambientais
Plantar florestas, mesmo
como atividade secundária
na fazenda, pode dar
dinheiro, deve dar dinheiro
HÁ CERCA de 20 anos, fiz uma
viagem à Suécia, para conhecer seu cooperativismo e sua
agricultura, atividade difícil em razão do clima que impõe apenas seis
ou sete meses por ano para as operações, do plantio à colheita.
Quase todas as fazendas possuíam
uma pequena área florestada. Quando começava a nevar, já em novembro, o agricultor ia até sua mata, cortava um número x de árvores, removia-as para a sede e passava o inverno trabalhando a madeira, serrando,
aparando, fazendo tábuas, vigotas,
peças para móveis etc. Quando a primavera dava seus primeiros sinais,
ele vendia a madeira preparada e
plantava, na mata, o mesmo número
x de árvores que havia cortado.
Interessado nesse trabalho, perguntei a um fazendeiro quem fiscalizava isso. E ele, estranhando a pergunta: "Fiscalizar o quê?".
Respondi imediatamente: "Quem
fiscalizava o fato de ele repor as árvores que tinha cortado". No mesmo
instante me dei conta da estupidez
da pergunta e da distância oceânica
que nos separava, culturalmente.
Claro, a floresta era uma atividade
econômica para ele, uma atividade
produtiva rural, como os grãos que
semearia na primavera. E, ainda por
cima, fazia uma contribuição positiva -e voluntária- em defesa do ambiente, mormente considerando que
a mudinha plantada demoraria uns
40 anos para ser colhida! Só na outra
geração! Mas calou fundo a idéia de
eco-eco, ecologia com economia.
Anos mais tarde, em visita a uma
fazendinha na Holanda, mês de
março, primavera começando, reparei que, no pequeno gramado em
frente à casa, aparado na véspera,
havia três estacas fincadas, em torno
das quais, em um diâmetro de 50
cm/60 cm, a grama não havia sido
cortada.
Questionado sobre o porquê daquilo, o agricultor me contou que naquela área havia um bulbo que na
primavera brotava, produzindo flores que estavam em extinção na região, e ele recebia uma subvenção
para preservá-las. Por isso não cortava o gramado ali, com medo de
cortar pequenas folhas que por acaso já estivessem nascendo.
De novo me encantou o modelo:
lá, dão um prêmio para quem preserva; aqui, uma multa para quem
não preserva. Lá, o positivismo; aqui,
o negativismo.
Ambas essas histórias poderiam
servir de motivação nas nossas intermináveis discussões sobre o tamanho da reserva legal, sobre a APP
(área de preservação permanente)
fazer parte da reserva legal, sobre a
compensação de áreas fora do perímetro da fazenda, sobre exploração
sustentada da reserva legal e, eventualmente, até da APP, e assim por
diante.
Deveríamos construir um modelo
de florestamento com essa visão positiva que incorpore o tema da economia no processo florestal produtivo, mesmo que essa não seja a principal atividade na propriedade rural.
O agricultor precisa ser estimulado
a cuidar do ambiente, para além da
questão cultural e/ou educacional.
Ecologia pode e deve dar lucro.
Já existem instituições que cuidam da prestação de serviços ambientais e resolvem isso, inclusive
com remuneração por meio de
CDM.
Da mesma forma, já existem modelos de certificação da madeira
produzida com esse tipo de exploração sustentada. E não é só: as produções de plantas medicinais, aromáticas, ornamentais são outras atividades em florestas plantadas, especialmente quando as árvores são nativas da região.
Plantar florestas, mesmo como
atividade secundária na fazenda, pode dar dinheiro, deve dar dinheiro. E
a contribuição ambiental virá muito
mais expressiva.
ROBERTO RODRIGUES, 65, coordenador do Centro de
Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do
Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.
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