São Paulo, segunda, 1 de junho de 1998

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TELEBRÁS
Especialistas afirmam que as regras para regular as compras após a privatização são inconstitucionais
Advogados criticam critérios da Anatel

FERNANDO GODINHO
da Sucursal de Brasília

Os critérios estabelecidos pela Agência Nacional de Telecomunicações para regular as compras de equipamentos e serviços por parte dos futuros controladores da Telebrás são inconstitucionais, segundo advogados ouvidos pela Folha.
Especializados em licitações, em concessões e no setor de telecomunicações, eles entendem que as regras da Anatel impedem o livre exercício da atividade econômica e representam uma ingerência do Estado sobre o setor privado.
Esses critérios estão nos contratos de concessão que serão assinados entre a agência e as operadoras do Sistema Telebrás amanhã.
Para os advogados consultados pela Folha, as regras de aquisição estabelecidas pela Anatel ferem artigos da Constituição que regulamentam os princípios gerais da atividade econômica.
De acordo com elas, os compradores da Telebrás serão obrigados a considerar ofertas de fornecedores independentes (nacionais e estrangeiros) antes de contratar serviços ou comprar equipamentos vinculados à atividade.
Havendo igualdade de preço, prazo e qualidade técnica entre produtos nacionais e importados, as concessionárias terão de realizar suas compras dentro do país e, preferencialmente, escolher produtos e serviços com tecnologia nacional.

Opiniões
"Não cabe à Anatel estabelecer regras para a compra de produtos. No máximo, ela pode determinar os padrões técnicos", diz o advogado Marçal Justen Filho.
Para ele, o Estado não pode definir qual será a nacionalidade dos fornecedores dos futuros controladores. "O risco da atividade corre por conta do concessionário. Se ele quiser comprar equipamentos mais caros que os produzidos no país, o problema é dele."
Para o advogado Erasmo Cabral, "a atividade econômica desenvolvida por particulares não pode sofrer interferências do Estado, a não ser para efeito de fiscalização ou de cumprimento de metas previamente conhecidas".
Cabral ressalta que a Anatel "engessa a atuação do empresário" ao estabelecer "parâmetros de comportamento" para as negociações dele com os fornecedores. "Quem arca com o risco do negócio é o concessionário", lembra.
O artigo 170 da Constituição assegura o livre exercício de qualquer atividade econômica, e o 174 garante ao Estado as funções de fiscalização, incentivo e planejamento -em caráter "indicativo" para o setor privado.
Nenhum dos 11 artigos da Constituição que trata dos princípios da atividade econômica confere à União (ou às agências reguladoras) a prerrogativa de interferir na gestão de empresas privadas.
Nas concessões de um serviço público, cabe ao poder público regulamentar os direitos dos usuários, a política tarifária das concessionárias e a qualidade do serviço oferecido.
"Ao privatizar a Telebrás, o Estado entende que a iniciativa privada está apta para exercer a atividade. Portanto, ela não pode interferir na gestão dos negócios de particulares", diz Erasmo Cabral.
Para ele, a Anatel está desconsiderando aspectos subjetivos e importantes para a operadora na hora de negociar suas compras.
"São interesses comerciais, tecnológicos e até mesmo diplomáticos que estão em jogo. É uma incoerência o órgão responsável pelo equilíbrio da competição desequilibrar a mesma."
Procurada pela Folha, a Anatel, presidida por Renato Guerreiro, não quis comentar a avaliação dos advogados.



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