São Paulo, sábado, 01 de julho de 2006

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Negociação comercial começa sob impasse

Primeiro dia oficial de encontro da OMC em Genebra termina com negociadores tentando refazer cronograma de Doha

União Européia e países em desenvolvimento fazem pressão sob os Estados Unidos para país reduzir seus subsídios agrícolas

SHEILA D'AMORIM
ENVIADA ESPECIAL A GENEBRA

As negociações para tentar definir cortes nos subsídios agrícolas e maior abertura comercial e industrial no mundo empacaram no primeiro dia oficial de discussão e mais uma etapa da chamada Rodada de Doha deve fracassar.
Reunidos na sede da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra, os representantes da União Européia (UE) e dos países em desenvolvimento, liderados pelo Brasil e pela Índia, não conseguiram arrancar dos EUA um compromisso para redução mais significativa dos subsídios dados pelo governo aos agricultores locais, o que gera uma distorção no comércio internacional.
Depois de um dia intenso de discussões com diferentes grupos, os ministros dos EUA, da UE, do Japão, do Brasil, da Índia e da Austrália, o chamado G6, reuniram-se na noite de ontem para definir uma fórmula de salvar a rodada, estabelecendo um novo cronograma para tentar desatar os nós que impedem o acordo.
A decisão do G6 deverá ser discutida oficialmente hoje. A Folha apurou que na reunião não se discutia mais a substância das propostas, mas como proceder daqui para a frente.
O clima de crise ficou evidente logo após o final da primeira reunião com um grupo de ministros de 30 países na manhã de ontem. O diretor-geral da OMC, o francês Pascal Lamy, alertou que se não houver uma mudança radical "nas próximas horas ou dias, estaremos numa crise". Para ele, sem uma sinalização de propostas firmes na área agrícola, não há como avançar em outros pontos.

Crise
O negociador brasileiro, o chanceler Celso Amorim, lamentou o impasse e, apesar de defender que ainda há esperança em conseguir algum avanço com os EUA, admitiu o risco de a rodada fracassar. "Estamos nos aproximando muito rapidamente de uma crise", disse. Ele ressaltou ainda que, algumas vezes, as crises fazem com que difíceis decisões políticas sejam tomadas. "Não será a primeira vez", afirmou.
Uma oferta maior dos EUA é considerada o fiel da balança e o que poderá evitar um fiasco dessa negociação em Genebra em torno da pauta de propostas assinada em 2001.
Isso porque a União Européia já admite rever sua proposta feita no ano passado de reduzir suas tarifas de importação de produtos agrícolas, em média, em 51%, como pede o G-20 (o grupo de países em desenvolvimento que exportam muitos produtos agrícolas). Até então, eles só aceitavam uma diminuição de 39%.
No entanto, será preciso que os Estados Unidos cortem significativamente os subsídios agrícolas dados aos agricultores norte-americanos. Atualmente, os EUA podem conceder subsídios até o montante de US$ 48 bilhões por ano. Nas negociações em 2005, entretanto, ficou acertado que esse valor ficaria limitado a cerca de US$ 20 bilhões.
Há, porém, sutilezas na definição dos programas que comporão esse limite que, na prática, darão margem à concessão de subsídios em áreas que hoje não são contempladas pelo governo dos EUA. Além disso, os países em desenvolvimento e a UE exigem que os norte-americanos diminuam para US$ 12 bilhões o total de subsídios, ainda considerado elevado.
O presidente George W. Bush, que conversou recentemente com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e teria se mostrado favorável a um avanço nessa área, é o maior empecilho. Segundo uma fonte que participa das reuniões em Genebra, a negociadora Susan Schwab (chefe do USTR, o ministério do comércio exterior dos Estados Unidos), recebeu orientações da Casa Branca para não "flexibilizar em absolutamente nada".
Numa reunião preliminar na noite de quinta-feira e durante os debates de ontem, Schwab não teria sequer aceitado sugerir, numa simulação, qual seria a oferta dos EUA se a UE cortasse ainda mais suas tarifas de importação, se aproximando do percentual de 66% que os americanos exigem. Provocada por Peter Mandelson, o comissário europeu, ela disse que "isso não fazia sentido".
Do outro lado, insistiu que a UE colocasse na mesa detalhes do que pretende fazer com os produtos que deverão ter tratamento especial ou integrar uma lista de exceção às regras que deveriam ser acertadas. Não teve resposta.
Já o secretário de Agricultura dos EUA, Mike Johanns, disse que o país já propôs uma redução significativa dos subsídios e disse que a proposta do G20 para corte das tarifas de importação da UE é insuficiente para a rodada de Doha avançar.


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