São Paulo, terça-feira, 01 de setembro de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Devagar com o andor


Para uma recuperação segura, é preciso manter por algum tempo os esquemas de UTI armados na crise


SETEMBRO chegou. Neste mesmo mês, um ano atrás, a economia mundial desabou e virou quase unanimidade a defesa das políticas conhecidas como anticíclicas. Elas eram óbvias, baseadas no princípio da formiga de La Fontaine, de que os recursos devem ser guardados quando a economia vai bem e gastados quando ela vai mal.
A ideia consensual era a de que o país deveria basear seu comportamento em três pontos: 1) Em nenhuma hipótese se render a teorias suicidas dos conservadores que sugeriam cortes de gastos públicos. A hora era de políticas keynesianas, com mais investimentos públicos e desonerações fiscais;
2) O Banco Central deveria deixar de lado sua política de juros altos, conhecida como uma das jabuticabas brasileiras, e cortar rapidamente a taxa básica, naquela época em 13,75% ao ano;
3) O governo também não deveria hesitar em usar reservas para evitar distorções no mercado de câmbio. Passado quase um ano, os jornais estão cheios de notícias sobre sinais de saída da crise tanto aqui quando no exterior.
A Europa parou de perder produção e os dois países da zona do euro, Alemanha e França, já apresentaram pequenas taxas de crescimento no segundo trimestre. O Japão também cresceu (0,9%) no período -assim como China, Rússia e Índia, estes com taxas mais altas.
No Brasil, a estimativa para o segundo trimestre é de expansão de 1,8% no PIB. Em julho, foram criadas 138 mil vagas de emprego no país, o índice de desemprego caiu para 8% (a taxa mais baixa do ano) e houve um pequeno aumento da renda média dos trabalhadores.
Ao olhar esses números, a tendência natural dos mais céticos é dizer que o crescimento em várias partes do mundo ainda é muito tênue e só ocorreu porque os recuos nos dois trimestres anteriores haviam sido muito fortes, em níveis nunca vistos desde os anos 30. Os menos céticos, entre os quais me incluo, observam que é muito melhor haver recuperação de produção, por menor que seja, do que continuar afundando.
Diante desse cenário, a dúvida que surge hoje é saber quando será o momento de parar com as medidas anticíclicas. Há sempre o risco de que a suspensão dos remédios antes da hora possa ameaçar a recuperação do doente. E isso vale para qualquer país.
Uma recomendação sensata, que tem sido feita por vários economistas, é olhar para os Estados Unidos. Lá o PIB ainda caiu 0,3% no segundo trimestre e a economia permanece bastante frágil, apesar de alguns sinais positivos. Em julho, o nível de consumo da população ainda era 6,8% inferior ao do mesmo mês do ano passado.
Enquanto não houver um claro sinal da retomada americana, não será hora de pensar da suspensão do receituário keynesiano, das medidas anticíclicas, e do alívio monetário e fiscal. Os Estados Unidos ainda são o pulmão do mundo, sozinhos, e têm um PIB quase igual ao de Japão, China, Alemanha e França juntos.
O Brasil está bem, mas é preciso ir devagar com o andor do conservadorismo. Nas conversas com empresários ligados à produção, todos preveem que a recuperação será lenta e gradual. Não há clareza sobre a economia em 2010. O risco de recaída será real se houver precipitação na supressão de estímulos fiscais, no corte de gastos públicos, na redução de crédito e na política de juros. Para ser segura, a recuperação terá de contar ainda por algum tempo com os esquemas de UTI armados nos piores momentos da crise.

BENJAMIN STEINBRUCH, 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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