São Paulo, sábado, 01 de novembro de 2008

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ANÁLISE

"Círculo mágico" separa países emergentes

KRISHNA GUHA
ALAN BEATTIE
DO "FINANCIAL TIMES"

As medidas tomadas pelo Federal Reserve e pelo Fundo Monetário Internacional para oferecer dólares de maneira rápida a um grupo seleto de mercados emergentes levantam dúvidas quanto ao impacto sobre os países que ficaram de fora desses esquemas.
A resposta inicial foi muito positiva, com uma reação ampla nas ações e nos títulos de dívida dos mercados emergentes.
Os investidores consideraram que mais apoio aos mercados emergentes em geral é positivo para todos eles.
Mas houve sinais de diferenciação no mercado cambial entre aqueles que agora têm acesso aos dólares do Fed -Brasil, México, Coréia do Sul e Cingapura- e os que não o têm.
Enquanto isso, especialistas expressaram preocupações residuais de que, ao posicionar um cordão protetor em torno de algumas economias emergentes, o Fed e o FMI possam agravar os desafios enfrentados pelas economias que estão fora do novo "círculo mágico".
"Se criamos uma classe de mercados emergentes que estão realmente protegidos e próximos dos países desenvolvidos, existe o risco de os cidadãos de segunda classe ficarem mais claramente diferenciados", diz Simon Johnson, ex-economista chefe do FMI.
Raghu Rajan, outro ex-economista chefe do FMI, diz que foi criada uma divisão entre "os que fazem parte do clube e os que estão fora dele", embora ele acredite que os efeitos negativos sobre as economias excluídas serão limitados.
O perigo de que ajudar alguns países possa prejudicar outros é uma variante internacional do problema criado quando governos correram para resgatar seus bancos, alimentando as pressões sobre as instituições financeiras não-bancárias.
Os políticos chamam a isso "o problema das fronteiras". É um dilema que reaparece quando as autoridades de todo o mundo reforçam seus esforços para limitar a crise do crédito.
O Fed e o FMI estão erguendo duas muralhas para proteger os mercados emergentes necessitados de dólares. Dentro do círculo formado pela muralha interna estão os quatro países que estão recebendo US$ 30 bilhões cada do Fed.
Esses países, segundo o Fed, são "sistemicamente importantes" e "bem administrados".
Eles lembram os bancos principais ao centro dos planos de resgate dos bancos. No círculo formado pela muralha externa estão os mercados emergentes vistos como candidatos dignos a receber empréstimos grandes e rápidos do FMI sob seu novo programa de concessão de créditos não condicionados.

Lista provável
O FMI não identificou os países que considera que mereceriam esses empréstimos, mas a lista incluiria os quatro apoiados pelo Fed, a República Tcheca, o Chile e também, possivelmente, a Polônia e alguns países asiáticos. Outros mercados emergentes podem ter direito a socorros do FMI, mas esses serão analisados caso a caso.
A diferenciação reforçada entre os mercados muda seus graus relativos de risco. A questão é se ela pode tornar alguns dos que estão fora dessas fronteiras ainda mais vulneráveis.
Foi o que ocorreu com os excluídos dos planos de resgate bancário. Empresas de financiamento de veículos e seguradoras pedem para receber o mesmo tratamento dado a bancos, mesmo que, para isso, precisem se converter em bancos.
Existem diferenças. As novas linhas internacionais de defesa se assemelham mais a um conjunto de círculos concêntricos que à divisão binária entre os bancos e os não-bancos.
Nenhum país está explicitamente excluído de receber ajuda, e os US$ 120 bilhões do Fed significam que agora há mais dinheiro disponível ao todo.
Ademais, os países não competem uns com os outros como os bancos e as seguradores. Há um "bem público" na forma de estabilidade do sistema.
Mesmo assim, algumas preocupações persistem. A exclusão das novas fontes de ajuda pode ser vista como indicativo de políticas insustentáveis ou de falta de apoio internacional.
Com quase US$ 50 bilhões comprometidos em pacotes de socorro e US$ 100 bilhões nominalmente reservados para novos empréstimos incondicionais, o FMI ficará com apenas US$ 100 bilhões para atender a todos os outros casos.
Além disso, as economias emergentes competem pelos capitais privados. Mudanças em suas posições relativas podem resultar em mudanças em portfólios que possivelmente levariam alguns países a perder em termos absolutos -do mesmo modo como o socorro aos bancos elevou o custo da dívida de Fannie Mae e Freddie Mac.
Michael Hugman, estrategista do Standard Bank, diz: "Sempre existe um perigo, especialmente no ambiente atual dos mercados, de que qualquer intervenção tenha efeitos negativos sobre os países excluídos das novas medidas".


Tradução de CLARA ALLAIN


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