São Paulo, sexta-feira, 02 de janeiro de 2009

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MICHAEL PETTIS

Ásia enfrentará um 2009 difícil


O excesso produtivo da Ásia precisa ser eliminado pela elevação do consumo ou pelo corte na produção

COM A recente desaceleração acentuada na produção industrial chinesa, a teoria quanto à desacoplagem mundial parece ter sofrido uma morte bem merecida. A ideia de que os países em desenvolvimento se haviam tornado menos dependentes das condições econômicas dos EUA, e assim poderiam estar isolados da crise norte-americana, baseava-se em uma poderosa combinação de má análise e de otimismo infundado. Na verdade, o primeiro estágio da crise afetou primordialmente os países que sofrem de déficits comerciais, entre os quais muitas das nações ricas. O segundo estágio verá a crise se expandir aos países que ostentam superávits comerciais, a maior parte dos quais em desenvolvimento.
A dependência dos países em desenvolvimento quanto à demanda dos EUA deveria ter sido óbvia com base nos dados dos balanços mundiais de pagamentos, que demonstram que o déficit comercial dos EUA e o superávit comercial dos países em desenvolvimento subiram, como proporção do PIB mundial, quase ininterruptamente entre 1997 e 2007. Isso sugere que há muito mais crise ainda por vir. Até agora, a crise envolveu principalmente o ajuste em países grandes e de consumo excessivo -EUA, Espanha, Reino Unido, França, Itália e Austrália. O balanço mundial de pagamentos precisa chegar a um ponto de equilíbrio, e uma redução no consumo em uma das pontas do balanço precisa ser compensada por um ajuste semelhante na ponta oposta.
Existem duas maneiras pelas quais o sistema pode se ajustar. Uma é que os desequilíbrios mundiais subjacentes se perpetuem. Os governos dos EUA e dos demais países com déficits comerciais podem tomar empréstimos e promover gastos agressivos para substituir o consumo domiciliar. Mas porque o consumo alimentado por endividamento em países como os Estados Unidos é um dos problemas fundamentais, simplesmente substituir o excesso de consumo de uma entidade americana pelo de outra não poderá servir de solução de longo prazo.
O segundo caminho é que os países com superávit comercial promovam forte crescimento do consumo interno, provavelmente por meio de maciça expansão fiscal que se equipare à queda no consumo dos domicílios norte-americanos e, com isso, reduzam o problema da capacidade de produção ociosa. O problema para essa solução é que a escala do ajuste requerido está além da capacidade da maioria dos países. O ônus do ajuste recairá sobre os que têm superávits comerciais, a menos que os que apresentam déficits se disponham a absorver grande parte dele. Mas, dadas as realidades políticas, é a produção asiática que tem maior probabilidade de declinar. Os problemas econômicos serão graves e potencialmente desestabilizadores.
Antes que isso aconteça, existe um grave risco de que países asiáticos, individualmente, tentem evitar essa contração na demanda via medidas comerciais que reforcem sua capacidade de exportar o excesso de capacidade -subsídios à exportação, financiamento subsidiado, desvalorização cambial, tarifas de importação- e assim lhes permitam forçar seus parceiros comerciais a cuidar do ajuste por excesso de capacidade.
O excesso de consumo dos EUA era parte essencial do recente desequilíbrio mundial -e esse consumo precisa cair, e a poupança nacional precisa crescer. Mas, da mesma forma que o excesso de consumo norte-americano precisa cair, o excesso de produção da Ásia precisa ser eliminado. Isso só pode acontecer por alta no consumo ou pelo corte na produção. A Ásia terá um 2009 difícil.


MICHAEL PETTIS é professor de finanças na Universidade de Pequim. Este artigo foi publicado originalmente no "Financial Times".


Tradução de PAULO MIGLIACCI


Hoje, excepcionalmente, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.


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