São Paulo, segunda-feira, 02 de fevereiro de 2004

Texto Anterior | Índice

FOLHAINVEST

MERCADO FINANCEIRO

Para analistas, modelo engessa política monetária e adoção de núcleo pode tornar sistema mais flexível

Economistas questionam metas de inflação

MARIA CRISTINA FRIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Economistas responsabilizam o regime de metas de inflação, baseado no IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) cheio e com tarifas indexadas, pela política de juros altos do Banco Central. Argumentam que o modelo precisa ser revisto e que, se a meta estivesse calcada no núcleo da inflação (que exclui tarifas e preços agrícolas), não seriam necessários juros tão draconianos, de imenso custo para o país.
Dentre mais de 20 países que adotam o sistema de metas ("inflation target"), apenas o Brasil usa a inflação cheia. Uma alteração do modelo de metas não acarretaria problemas de credibilidade, uma vez que, decorridos quase cinco anos, ele já está consagrado, segundo economistas. A meta para 2004 é de 5,5%, e, para o ano que vem, de 4,5%.
"Já há maturidade para revisão desse modelo", diz Hugo Penteado, economista-chefe do ABN Amro Asset Management. "É preciso avaliar o custo social desta política econômica, se faz sentido ter meta com este impacto. Com metas em cima de preços livres, estaríamos mais confortáveis."
Estima-se que, num cenário benigno, os preços administrados tenham reajustes de 7,8% neste ano. Para cumprir a meta, os preços livres, que pesam mais nos índices de inflação e subiram 8,1% em 2003, teriam que aumentar no máximo 4,5%.
"O discurso do BC [temeroso da inflação] encobre a raiz do problema: o regime de metas, baseado no IPCA cheio e com tarifas indexadas, que engessa o país, dificulta baixar juros. Essa culpa não é do BC, que tem de zelar pela regra", diz Alexandre Póvoa, economista do Banco Modal.
"Essa política de juros tem um custo enorme para o Brasil. A manchete da Folha de sábado [sobre o gasto com juros da dívida que consome a economia feita pelo país] reflete essa política. Se olhassem para o núcleo, não precisariam de uma política de juros tão agressiva", diz João Luiz Máscolo, professor do Ibmec.
Se houver elevação forte dos preços administrados, há o risco de não haver mais corte de juros. "Podem até aumentá-los e as empresas nem chegarem a se animar e contratar", diz Penteado.
Elevar os juros agora não teria muito efeito sobre a inflação, pois não impediria que as tarifas subissem. Não é problema de oferta e demanda, segundo analistas.
"Tinha que trabalhar com núcleo, separando o que é efeito de política monetária do efeito de contratos, sazonalidade, aumento de imposto", diz Máscolo.
Póvoa concorda e sugere desindexar as tarifas, à medida que vençam os contratos. "Poderiam retornar ao índice cheio quando tarifas estiverem desindexadas."
"Não precisam tirar do índice. Podem estabelecer válvulas de escape, como quando o petróleo sobe. O sistema precisa ser aperfeiçoado, e já perderam oportunidades", diz Jorge Simino, consultor da MS Consult.
De acordo com os analistas, o governo resistiria a mudanças do sistema por temer reações.
"O país tem um histórico de manipulação de índices. Se não for bem explicado, as pessoas terão medo de mexer nos salários. O governo não quer assumir esse custo político. O governo Fernando Henrique não quis. Este, muito menos", diz Máscolo. "Vai estourar meta? Tudo bem. Foi fixada com base em índice errado mesmo... É de um primitivismo não ter núcleo. Todas as economias têm. Ninguém discute mais isso."
Ainda segundo os economistas, fatos pontuais, como a elevação da Cofins, não deveriam entrar no cálculo da meta.



Texto Anterior: Regulamentação: Frutas e hortaliças das Ceasas ganham rótulo

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.