São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

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ENTREVISTA

Economista peruano lista benefícios de trazer empresas à legalidade, como reduzir crimes e elevar confiança

Reforma deve olhar mais pobres, diz Soto

DA REPORTAGEM LOCAL

O economista peruano Hernando de Soto, presidente do ILD (Instituto Liberdad y Democracia), formulou, entre 1988 e 1995, cerca de 400 propostas, leis e regulamentos que permitiram modernizar a economia do Peru.
Os programas coordenados por De Soto, ex-assessor pessoal do ex-presidente peruano Alberto Fujimori (1990-2000), foram responsáveis pela concessão de 1,5 milhão de títulos de propriedade para famílias pobres no Peru e pela legalização de 400 mil empresas, além da simplificação da burocracia para negócios no país.
Nesta semana, De Soto estará no Brasil para o 19º Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, que discutirá temas relacionados à democracia brasileira. Leia entrevista que concedeu à Folha. (FCZ)

Folha - O sr. acha possível fazer no Brasil algo semelhante ao que foi obtido no Peru?
Hernando de Soto -
Não existe razão para que os problemas no Brasil sejam diferentes dos de outros países. Nos últimos 50 anos houve uma migração enorme nos países em desenvolvimento ao ponto de algumas cidades terem aumentado de tamanho mais de 15 vezes. Quase 5 bilhões dos 6 bilhões de habitantes do planeta vivem hoje em moradias precárias. Isso produziu dois tipos de economia, a legal e a ilegal, que começa com o fato de seus representantes residirem em locais fora do âmbito das leis que regem a economia formal.

Folha - Quais os principais resultados obtidos no Peru?
De Soto -
O primeiro foi uma forte redução das atividades criminosas. O segundo é que o valor das casas dos pobres aumentou e os salários médios dos residentes praticamente dobraram. Ao longo dos anos, houve ainda um aumento de 28% no número de crianças que freqüentam a escola.
Mas isso não é um efeito apenas da concessão de titularidade para as casas. A legalização de negócios é tão importante quanto. O custo de ter empresas fora da lei tem sido muito alto para países em termos de crédito, crimes, de serviços públicos e de confiança geral.
O problema atual é que duas das principais recomendações do chamado Consenso de Washington [regras liberais formuladas nos anos 90] não estão sendo colocadas em prática na América Latina: o acesso à propriedade e à formalização das empresas. Se esses dois elementos não funcionarem, os outros não funcionarão.

Folha - O próprio Banco Mundial e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) procuram estimular iniciativas desse tipo. Por que elas não decolam?
De Soto -
Tem sido muito difícil pelo fato de a maior parte dos esforços estar sempre concentrada em iniciativas de mapeamento e pesquisas. Quando isso é feito, você acaba sabendo quem vive nas áreas de favelas, mas não quem são os seus donos. Esse é um programa que requer a intervenção de quem está no topo da pirâmide política, das pessoas que têm poder para resolver politicamente a questão da titularidade.

Folha - No caso brasileiro, como é possível atrair empresas para a legalidade com uma carga tributária superior a 35% do PIB?
De Soto -
Em todos os países que olhamos, as respostas foram diferentes. No caso do Peru, mudamos as leis para beneficiar as pequenas empresas sem mudar a questão da carga tributária. Mais de 400 mil empresas passaram à legalidade. No Peru, como em qualquer outro país que esteja negociando tratado de livre comércio com os EUA, é preciso, por exemplo, ter instrumentos para fazer notificações de embarques.
A primeira coisa que se exige é um endereço. A segunda, uma razão social, a terceira, um número de identidade dos donos da empresa e assim por diante. Descobrimos que, se todas essas perguntas tivessem de ser respondidas, somente 30% das empresas peruanas poderiam fazê-lo.


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