São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NOVA ECONOMIA

Esquema para inchar pagamento por página visitada afeta ações da empresa, que tem 99% da receita com publicidade

Fraude do clique ameaça valor do Google

ANTHONY EFFINGER
JONATHAN THAW

DA BLOOMBERG
Clique-clique. Em uma ruazinha de Nova Déli, deixando para trás os carrinhos que vendem verduras e descendo um lance de escadas, o conhecido som de um mouse de computador é sinal de problemas para o Google Inc.
Em um quartinho de porão, Rajiv Kumar vende nomes de sites que pagam para que pessoas cliquem em anúncios da internet. Preço: 300 rupias (US$ 6,74). "Não há nada de errado nisso", diz Kumar a um cliente potencial. Clicar é fácil, diz ele.
É fácil -mas também é um atoleiro legal. A prática, conhecida no setor como a "fraude do clique", explora os pontos fracos do sistema de pagamento por número de cliques (pay-per-click) que tornou o Google, sediado em Mountain View, no Estado norte-americano da Califórnia, um prodígio da web.
O Google, o Yahoo! e outros provedores de busca vinculados a anúncios on-line cobram de seus anunciantes toda vez que alguém clica em seus links publicitários. Ao aumentar o número de cliques nesses anúncios, as pessoas que cometem esse tipo de fraude inflacionam artificialmente as contas pagas pelos anunciantes, que dessa forma são ludibriados.
As pessoas que exibem em seus sites anúncios repassados pelo Google recebem dos anunciantes mais da metade do pagamento quando algum usuário clica nos anúncios exibidos.
Para aplicar a fraude do clique, basta criar um site e, em seguida, se inscrever on-line no Google para solicitar a exibição de anúncios em seu site. Sempre que alguém visitar o site e clicar nos anúncios que aparecem nele, seu proprietário receberá por isso.
O Google, que diz estar tentando combater esse tipo de fraude, lucra também, no entanto, com o tráfego de cliques falsos. A menos que a empresa ou seus clientes detectem os cliques fraudulentos, o Google recebe por eles.
No último dia 8 de março, o Google -sem ter admitido nem negado ter cometido nenhum delito- aceitou pagar cerca de US$ 90 milhões para resolver com acordo sua participação em uma ação judicial que envolveu todo o setor de internet e alegava que as operadoras de ferramentas de busca na internet cobram de seus clientes por cliques que não foram gerados por usuários reais.
A fraude do clique é apenas uma das dores de cabeça do Google e seus acionistas. As ações da empresa despencaram neste ano, após terem mais do que quintuplicado de valor desde 2004.
Alguns investidores receiam que os cliques fraudulentos e a intensificação da concorrência, especialmente por parte da Microsoft, brecarão o crescimento do Google. A Microsoft pretende lançar um sistema de anúncios on-line concorrente -cujo codinome é Moonshot- no próximo mês de junho.

Analistas nervosos
O Google irritou os analistas de Wall Street ao deixar de informá-los a respeito da fraude dos cliques e de outros problemas, diz Scott Devitt, analista do Stifel, Nicolaus & Co., um banco de investimento de St. Louis.
O Google se nega a revelar quantas buscas os usuários realizam em sua famosa ferramenta de busca na internet. A empresa também não fornece previsões sobre vendas ou lucros trimestrais. O conteúdo do acordo firmado pela empresa em março passado para resolver sem litígio a ação sobre a fraude do clique apareceu pela primeira vez no blog do Google, em um despacho da consultora jurídica associada da empresa, Nicole Wong.
"Uma empresa que não lhe diz nada a respeito de seus negócios merece um desconto (no preço de suas ações)", disse Devitt.
O analista emitiu a recomendação "vender" para as ações do Google no último dia 18 de janeiro, pouco antes de os papéis terem apresentado queda. Ele elevou sua recomendação para "manter a posição" em 6 de fevereiro e, em seguida, para "comprar" em 24 de março, pouco tempo após a agência de classificação de risco Standard & Poor's ter dito que o Google seria incluído no índice S&P 500. Em sua recomendação para "comprar" as ações da empresa, Devitt disse que o comportamento reticente do Google ainda perturbava.
As fraudes dos cliques atacam o coração do Google, cuja rede de anúncios baseada em palavras-chave gera 99% da receita da empresa, diz David Tice, que está vendendo ações do Google a descoberto, por ter um pouco mais de contratos vendidos do que comprados de ações da empresa, e administra US$ 450 milhões no Prudent Bear Fund. "Isso me assusta", disse Tice, presidente da David W. Tice. Futuramente, as fraudes e a concorrência prejudicarão o Google e suas ações, diz ele. Por isso, ele está apostando contra as ações do Google.
O diretor financeiro do Google, George Reyes, disse a investidores durante uma conferência realizada em Nova York no último dia 28 de fevereiro que o crescimento da empresa poderá desacelerar. Reyes disse publicamente o que muitos investidores temiam secretamente: o Google, cuja receita disparou 71 vezes desde 2001, não será capaz de sustentar esse ritmo de expansão para sempre.
Futuramente, a empresa -cujo nome vem de "googol", o número representado pelo algarismo 1 seguido de cem zeros- se tornará tão grande que, com base em cálculos matemáticos simples, sua taxa de crescimento deverá desacelerar, disse Reyes.

Ações despencam
Até 13 de março, os papéis da empresa haviam despencado para a cotação de fechamento de US$ 337,06, comparativamente a sua alta recorde de US$ 475,11 em 11 de janeiro passado, um recuo de 29%.
O principal executivo do Google, Eric Schmidt, diz que a sua empresa só se movimenta para cima. Desde o ano passado, o Google ultrapassou os US$ 18 bilhões anuais em publicidade on-line e passou a intermediar a venda de espaço publicitário em rádios e revistas. A empresa lançou um serviço de vídeo pay-per-view em janeiro passado.
"Essas são áreas de atuação muito grandes", disse Schmidt. Ele está certo: o mercado mundial de anúncios na internet, no rádio, na TV e na mídia impressa, totalizou US$ 404 bilhões no ano passado, segundo o ZenithOptimedia Group Ltd., empresa de serviços de mídia.
Como parte de sua expansão, em janeiro passado o Google aceitou comprar a americana dMarc Broadcasting Inc. por US$ 102 milhões em dinheiro -e com a promessa de pagar cerca de US$ 1,14 bilhão adicionais no futuro. A dMarc permite que os anunciantes transmitam seus anúncios para mais de 500 estações de rádio dos Estados Unidos.
O Google, diz Schmidt, pretende permitir que os anunciantes comprem tempo de transmissão, gravem seus anúncios e os enviem a estações de rádio por meio da net. "Essa coisa vai ser uma jogada muito, mas muito grande."
No ano passado, o Google se lançou no setor de mídia impressa ao comercializar espaços publicitários para anunciantes nas revistas "PC Magazine" e "Maximum PC". Em fevereiro, a empresa expandiu seu alcance para 28 publicações, entre as quais a "Car and Driver". Com parte de uma fase de testes, o Google permitiu que os anunciantes fizessem ofertas pelos espaços nessas revistas por meio de leilões on-line.
Nesse meio tempo, um programa do Google chamado Google Sidebar está disputando cabeça a cabeça com a Microsoft. O Sidebar, que foi criado para reduzir a dependência dos internautas do navegador Internet Explorer, da Microsoft, aparece como uma janela no canto da tela do computador. Essa janela é continuamente atualizada com notícias e previsões meteorológicas.
Neste ano, o Google voltou suas baterias para o Microsoft Office -que gera US$ 11 bilhões por ano em vendas para a Microsoft- ao comprar a Upstartle, empresa que criou o programa Writely, um software de processamento de texto baseado na internet. Para contra-atacar, o presidente do conselho administrativo da Microsoft, Bill Gates, está criando uma janela parecida com a do Sidebar para o Vista, a próxima versão do Windows.
Os bilionários fundadores do site Google, Sergey Brin e Larry Page, estão perseguindo suas próprias ambições elevadas. Brin, 32, e Page, 33, estão participando de um processo de licitação para fornecer acesso à internet de banda larga sem fio a toda a cidade de San Francisco. Eles também estão tentando tornar os conteúdos de todos os livros existentes passíveis de serem localizados on-line.

Cientista
Brin e Page gostam de correr riscos, segundo Schmidt. "Eles geralmente estão à minha frente."
Schmidt, que já foi conhecido por defender o software Java Internet quando ocupava o cargo de diretor de tecnologia da Sun Microsystems, diz que a fraude do clique não ameaça nada disso.
"Acredite em mim, que sou um cientista da área de informática: temos a capacidade de detectar os cliques inválidos antes que eles alcancem os anunciantes", diz Schmidt, que é doutor em ciência da computação pela Universidade da Califórnia, em Berkeley. "Os ataques direcionados a nós são facilmente detectados."
Schmidt se recusa a dizer qual a taxa de penetração da fraude dos cliques nem revela como, exatamente, sua empresa os combate. Revelar isso ajudaria os fraudadores, diz. Schmidt diz que os acionistas não deveriam se preocupar: o Google monitora todos os cliques e reembolsa anunciantes por muitos dos cliques fraudulentos.


Texto Anterior: Frase - Concorrência
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.