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OPINIÃO ECONÔMICA
Gastar bem
BENJAMIN STEINBRUCH
Ontem foi o Dia do Trabalho, mas o assunto da hora
nas páginas de economia dos jornais têm sido as despesas do governo. Muito papel e tinta foram
gastos nos últimos dias para noticiar e comentar os números das
contas públicas no primeiro trimestre.
Vale a pena fazer um resumo
dessa "ópera" para facilitar a
compreensão de quem não tem
muita paciência para tema tão
árido. Os governos federal, estaduais e municipais iniciaram o
ano eleitoral com o pé no acelerador em matéria de gastos. Com isso, em janeiro o superávit primário (receitas menos despesas, exceto gastos com juros) caiu para
R$ 3,066 bilhões. Foi um valor
muito baixo, que representou
apenas um quarto do resultado
alcançado um ano antes, em janeiro de 2005.
O governo procura fazer superávits primários para pagar pelo
menos uma parte substancial dos
impressionantes gastos com juros
da dívida. O superávit de janeiro,
porém, nem de longe foi suficiente
para cobrir a carga de juros de R$
17,9 bilhões que incidiu sobre a
dívida em janeiro. Ou seja, houve
um déficit nominal de R$ 14,8 bilhões no primeiro mês do ano.
Quando esse resultado foi divulgado, começou uma gritaria.
Imediatamente imaginou-se,
com razão, que os governos (federal, estaduais e municipais) tivessem iniciado a fase de abertura
dos cofres do ano eleitoral, o que
poderia representar um grave risco para a estabilidade da economia.
Nos dois meses seguintes, porém, a situação mudou. O aperto
fiscal aumentou em fevereiro e o
de março foi tão grande que produziu o maior superávit primário
-R$ 13,2 bilhões- nesse mês dos
últimos 15 anos. Uma economia
de gastos suficiente para pagar todas as despesas com juros da dívida no mês, de R$ 12,8 bilhões.
Esses números, divulgados na
semana passada, acalmaram um
pouco os ânimos da barulhenta
torcida fiscalista, o influente grupo de formadores de opinião que
prega obstinadamente o controle
rigoroso das contas públicas. Afinal, o setor público fechou o primeiro trimestre do ano eleitoral
com o superávit fiscal até um
pouco acima da meta de 4,25%
do PIB (Produto Interno Bruto).
A torcida fiscalista, porém, não
está convencida das boas intenções fiscais do governo federal.
Observa que no primeiro trimestre do ano passado o superávit foi
muito maior (R$ 20 bilhões) que
neste ano e cobra mais austeridade. Em sua defesa, o pessoal do
governo diz que em anos de eleição há uma dinâmica diferente,
que tende a concentrar mais gastos no início de ano, com queda
natural no segundo semestre em
razão das restrições impostas pela
lei eleitoral. Exemplo: o resultado
fiscal do primeiro trimestre de
2002, também um ano eleitoral,
foi pior do que o deste ano.
Há exageros nos dois lados. O
pessoal do governo não dá a devida importância, por exemplo, ao
aumento que está por vir nos gastos mensais da Previdência em
decorrência da elevação do salário mínimo de R$ 300 para R$ 350
a partir de maio. Só esse fator representará um dispêndio mensal
adicional de R$ 1 bilhão para o
governo e o déficit da Previdência
poderá ser R$ 10 bilhões superior
ao de 2005.
Do lado da torcida fiscalista o
exagero está em exigir do governo, em ano eleitoral, comportamento de freira. Existe uma meta
fiscal (superávit primário de
4,25% do PIB) e ela precisa ser
cumprida. Pedir mais do que isso
denota um certo viés político da
crítica. Ou seja, a intenção de carimbar o governo como perdulário, o que não espelha a realidade
dos primeiros três anos de governo.
O Dia do Trabalho, comemorado ontem em quase todo o mundo, nos faz lembrar que o gasto
público, quando bem direcionado
-para investimentos e obras de
infra-estrutura, por exemplo- é
muito saudável para a economia.
Ele estimula negócios e cria empregos. Triste é quando os gastos
se concentram em despesas correntes e em juros. No ano passado, o governo conseguiu um superávit primário de R$ 93 bilhões e
gastou R$ 157 bilhões em juros.
Todo o esforço fiscal foi jogado no
ralo.
A discussão fiscal, portanto, está
fora de foco. Não se trata de escolher entre gastar mais ou gastar
menos. A melhor decisão, na verdade, é a de gastar tudo o que for
possível, dentro das metas, mas
gastar bem.
Benjamin Steinbruch, 52, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho
de administração da empresa e primeiro
vice-presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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