São Paulo, quarta-feira, 02 de maio de 2007

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"Risco-Bolívia" já reduz uso de gás no país

Conversão de carros cai 65% em abril; indústrias e residências buscam alternativa por temor de nova crise com vizinho

Grandes consumidores tentam garantir fonte de energia alternativa ao produto boliviano em caso de novas interrupções

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Batizado de "risco-Bolívia", o receio quanto ao futuro do suprimento de gás natural no Brasil fez cair o número de conversões de veículos movidos a GNV (gás natural veicular) e provocou uma corrida de indústrias dispostas a trocar o combustível ou investirem em tanques de emergência de GLP (gás de cozinha).
Tal receio cresceu depois da interrupção, no mês passado, da produção do campo de San Alberto, que obrigou o corte do gás à Argentina e à usina térmica de Cuiabá (MT) e quase afetou a distribuição da Petrobras.
O episódio provocou uma retração de 65% nas conversões de veículos a gás em abril, segundo a Abegás (Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás). Em média, são convertidos cerca de 20 mil veículos por mês.
O presidente da Abegás, Armando Laudario, disse que, sob risco de desabastecimento de gás, o primeiro segmento a sofrer é o do GNV. "As pessoas vêem uma notícia como essa na TV, de que pode faltar gás, ligam para a oficina e desmarcam a conversão", disse.
Segundo ele, o crescimento cada vez menor do GNV explica a desaceleração do mercado de gás natural no país, que crescia à taxa de 20% ao ano até 2004. Em 2005, o ritmo já foi menor (8%). Em 2006, ficou em apenas 4%.
Para Francisco Barros, vice-coordenador do Comitê de GNV do IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo), o setor já havia sentido uma redução das conversões por conta do aumento de até 23% do gás natural nacional da Petrobras a partir de ontem, que nos postos tendem a chegar a 8%.
Na indústria, diz Barros, não há como reduzir o consumo, mas as distribuidoras já sentem demanda maior de empresas que procuraram a troca do gás natural por outro combustível.
Não fosse o receio de desabastecimento, avalia, o segmento industrial, que corresponde a cerca de 60% do consumo, poderia estar crescendo a taxas maiores. Em fevereiro, a expansão foi de só 2,5%.
O temor de serem obrigadas a parar suas linhas de produção por falta de gás e amargarem prejuízos enormes fez com que muitas indústrias trocassem o gás de suas caldeiras, fornos e outros equipamentos por combustíveis alternativos, especialmente o GLP.
As distribuidoras de GLP (gás de cozinha) já notaram a demanda crescente de indústrias e empresas comerciais que buscam tanto a conversão do gás para o GLP como a instalação de tanques para uso como "backup" -ou seja, para suprir a unidade emergencialmete em caso de falta de gás natural.
A SHV Gas Brasil, uma das maiores distribuidoras de GLP do país, já foi procurada por mais de 30 empresas que querem investir em equipamentos de "backup". Outras dez pretendem abandonar o uso de gás natural e substitui-lo por GLP.
Segundo Rubem Mesquita, diretor de marketing e vendas da SHV, dona das marcas Supergasbras e Minas Gás, as indústrias com grande consumo e nas quais o peso do combustível no custo de produção é elevado optam pela instalação de tanques de "backup".
Já as indústrias menores ou que não são tão dependentes do gás partem direto para a substituição, diz Mesquita.
É o caso da lavanderia catarinense Hospitec Produtos Hospitalares, que, insatisfeita com os resultados do gás natural, está convertendo suas unidades para o uso de GLP.
A empresa de autopeças Mubeia do Brasil e a companhia de equipamentos para energia Icomisa também já realizaram a conversão.
Mesquita disse que empresas maiores e intensivas no uso de gás natural, como Ambev, Acesita e Gerdau, já procuraram a SHV para instalar unidades de "backup".
O superintendente da Abividros (Associação Nacional dos Produtores de Vidros), Lucien Belmont, disse que, para as indústrias intensivas em gás, como vidreiras, siderúrgicas e químicas, é inviável usar GLP por causa da dificuldade de armazenar grandes volumes e em razão do elevado custo.
Enquanto o gás natural sai por cerca de US$ 6 o milhão de BTU (medida de energia), o GLP sai por volta de US$ 12.
"O que aconteceu foi que a Petrobras estimulou o consumo há quatro anos e fez tudo mundo converter para gás natural. Agora, as indústrias vivem com uma faca apontada, que é o risco de desabastecimento da Bolívia e a possibilidade de um racionamento de gás em 2008 ou 2009", disse Belmont.


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