São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

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VINICIUS TORRES FREIRE

Um poço sem fundo de dúvidas


Linhas gerais do modelo de exploração do pré-sal abrem brechas para má politização do novo negócio do petróleo

CADA VEZ que vaza uma "definição" do governo Lula a respeito do pré-sal abre-se um novo poço fundo e escuro de dúvidas. De menos incerto, sabe-se que os objetivos aparentes do governo são: 1) reservar para o Estado receita maior do petróleo e centralizar sua administração e/ou distribuição no governo federal; 2) substituir o monopólio estatal, extinto em 1997, pelo controle operacional da exploração no pré-sal e outras "áreas estratégicas"; 3) via Petrobras, que será a operadora de toda a exploração no pré-sal, dar prioridade à compra de equipamentos e tecnologia nacionais; 4) por meio da Petrosal, a nova estatal petrolífera, administrar o comércio e talvez o ritmo da exploração do petróleo do pré-sal.
O problema é como tais objetivos serão trocados em miúdos, na prática. Nem se discute se a Lei do Petróleo "dos tucanos", de 1997, ainda presta ou não. Mas se o projeto mutante do governo faz sentido. A receita do Estado no pré-sal virá da "partilha". No sistema atual, o governo recebe bônus de assinatura, aluguel de áreas, royalties e participações especiais. Na partilha, as petroleiras entregam ao governo parte da produção. Tais recursos irão para um Fundo de Desenvolvimento Social (FDS), administrado por ministérios -não se sabe quais. Também se desconhece quem será o gestor de fato desse baita fundo. O caso recente do Codefat ilustra o rolo que pode advir da gestão de fundos "sociais".
Em tese, o FDS faria investimentos (financeiros, em infraestrutura, não se sabe bem). Só o rendimento do FDS seria aplicado no "social".
Nada se sabe sobre a distribuição regional dos recursos do pré-sal. Hoje, Estados e cidades "produtores" levam fatia gorda da renda do petróleo. O dinheiro será carimbado e dividido, como os fundos constitucionais, que em parte vão para o ralo?
A Petrosal seria uma "trading": decidiria que negócios fazer com o petróleo. Pode receber a receita do pré-sal na forma de petróleo vivo, a fim de decidir qual o melhor destino do produto (vender bruto ou refinado, exportar ou não), o que é operacionalmente complicado. Diz-se que a Petrobras é que vai negociar em nome da Petrosal. Ou vai decidir tudo, no fim das contas?
Diz-se que a Petrobras será a operadora de todos os blocos do pré-sal: a gerente da empreitada, em suma.
Mas teria sócias na exploração, empresas que disputariam licitações. Quem decide como será dividida a participação de Petrobras e outras empresas? Quando a Petrobras terá o monopólio? Como empresa mista, a Petrobras pode ter o privilégio de ser a "gerente-geral" do pré-sal?
No sistema de partilha, há o risco de uma petroleira chutar os custos para o alto, reduzindo a renda do concessionário dos campos de petróleo (o Estado). A Petrosal cuidaria de evitar tais corrupções. Como? Sendo sócia nos blocos de exploração? Isso evita corrupções?
O governo quer uma fatia maior dos dividendos em tese mais gordos que a Petrobras distribuirá. Para tanto, quer aumentar sua fatia no capital (ações) da Petrobras. De onde sairá o dinheiro para tanto? Vai antecipar receita do pré-sal? Com base em qual fluxo de receita futura?
Ou o governo vai "vender" campos à Petrobras? Acionistas minoritários vão poder comprar novas ações?

vinit@uol.com.br


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